sábado, 9 de setembro de 2017

A origem do Serviço Público e o Serviço Público no Brasil

(Texto: Regina Negreiros).
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A ORIGEM DO SERVIÇO PÚBLICO

Historicamente o serviço público teve seu início oficial e jurídico na França, no início do século XIX e final do século XX. No entanto, pode-se buscar uma primeira noção na Grécia antiga, onde o serviço “era prestado pelos detentores de grandes fortunas em forma de imposição honrosa, e não pelo poder organizado em forma de estado” (JUSTEN, 2003, p. 17). Posteriormente a esse momento, mas ainda no mesmo período, Grotti (2003, p. 20) atribui a Rousseau o uso originário da expressão “serviço público” de duas maneiras:
·        Concebe-se como atividade estatal que sucede ao serviço do Rei, porque se operou uma substituição na titularidade da soberania e também atividades destinadas ao serviço público, isto é, a atividades das quais se asseguram aos cidadãos a satisfação de uma necessidade sentida coletivamente.
 O serviço público francês foi fundado na ideia republicana de igualdade e liberdade, sendo caracterizado por disputas que, muitas vezes, ultrapassaram o âmbito jurídico.
·     Ele figura entre as imagens fundadoras sobre as quais apoia a identidade coletiva; mexer com o serviço público é considerado um ato de sacrilégio, que pode atingir os fundamentos do Estado e ferir a unidade nacional (CHEVALLIER, 2007, p.77).
 A Revolução Industrial propiciou o desenvolvimento econômico e contribuiu para o surgimento de uma diversidade de serviços públicos diferentes, como linhas férreas, telégrafos, telefones, distribuição de água e energia etc., o que delineou o modelo francês do serviço público prestado à população, o que denota que, naquele país, tal serviço é um dos aspectos fundamentais do seu desenvolvimento histórico.

 Serviço Público no Brasil: Do Império à República Atual

 No Brasil o serviço público teve sua origem em 1808, com a instalação da Real Família Portuguesa que, diante da necessidade de promoção do desenvolvimento da então colônia, dentro dos parâmetros da diplomacia real, percebe a importância do trabalho administrativo.
 Após a proclamação da República, o funcionalismo tornou-se mais forte, colaborando direta e indiretamente com a administração, executando ações que movimentaram e impulsionaram os serviços básicos e essenciais de que necessitam os cidadãos em suas relações sociais com o Estado, no entanto, não existiam regulamentação nem legislação específica ou mesmo denominação alguma para os servidores do da República brasileira.
 Aos vinte e oito dias do mês de outubro de 1939, surge um dos primeiros documentos que consolida normas referentes ao funcionalismo público: o decreto 1713/39. Em 1943, o então presidente Getúlio Vargas, institui o dia 28 de outubro como dia do funcionário público e, em onze de dezembro de 1990, publica-se o novo estatuto dos Servidores Públicos Civis da União, das Autarquias e das Fundações Públicas Federais, que consolida o termo Servidor Público, através da Lei 8112/90, o Regime Jurídico Único – RJU. No entanto, antes da aprovação da Lei 8112/90, a Constituição Federal de 1988 estabeleceu e forneceu referências em relação ao Serviço Público. A Constituição anterior, a Carta Magna de 1934, nada falava sobre o serviço ou o servidor público.
·        Trata-se de uma atividade de titularidade do Poder Público, que não se desnaturam quando a execução é delegada a particulares, pois a Constituição fixa um vínculo orgânico com a Administração, ao dispor, no caput do art. 175, que incumbe ao Poder Público a prestação de serviços públicos, diretamente ou sob regime de concessão ou permissão (GROTTI, 2003, p.89).
 A Constituição de 1988 nasce em um momento político que tinha como paradigma a luta entre o comunismo e o capitalismo, consubstanciando-se como uma carta de bem estar social de uma vida mais digna, cujo objetivo é prestar ao cidadão as condições necessárias para se viver dignamente, provendo-lhes as necessidades básicas. Em relação ao Serviço Público, surgem as principais características para sua definição, estabelecendo-se parâmetros para determinar o direito público e o privado. O período anterior foi marcado pela falta de esteio para o servidor e o ingresso era realizado através apadrinhamento ou troca de favores, não havendo a necessidade de concurso público. Só a partir da promulgação da Constituição de 88, com a ideia de justiça centrada na isonomia de oportunidades para todos, através do art. 37, parágrafos I e II, estabeleceu-se o concurso público que, consigo, trouxe mais qualidade ao serviço público. 
·         Art. 37. A administração pública direta, indireta ou fundacional, de qualquer dos Poderes da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios obedecerá aos princípios de legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade e eficiência, e também, ao seguinte:
  • I – os cargos, empregos e funções públicas são acessíveis aos brasileiros que preencham os requisitos estabelecidos em lei;
  • II – a investidura em cargo ou emprego público depende de aprovação prévia emconcurso público de provas ou de provas e títulos, ressalvadas as nomeações para cargo em comissão declarado em lei de livre nomeação e exoneração. (BRASIL, CF/88.1999, p.40).
 O artigo supramencionado não trata apenas do ingresso no serviço público, ele é o esteio, a fundação basilar para nortear o servidor e elencam os princípios inerentes à Administração Pública, função é dar unidade e coerência ao Direito Administrativo, controlando as atividades administrativas de todos os entes que integram a federação brasileira (União, Estados, Distrito Federal e Municípios). Dos princípios da legalidade e da supremacia do interesse público sobre o particular nascem os demais princípios. Os parágrafos do Art. 37 normatizam o serviço público, conforme abaixo:
·        III – o prazo de validade do concurso público será de até dois anos, prorrogável uma vez, por igual período;
  • IV – durante o prazo improrrogável previsto no edital de convocação, aquele aprovado em concurso público de provas ou de provas e títulos será convocado com prioridade sobre novos concursados para assumir cargo ou emprego, na carreira;
  • V – os cargos em comissão e as funções de confiança serão exercidos, preferencialmente, por servidores ocupantes de cargo de carreira técnica ou profissional, nos casos e condições previstos em lei;
  • VI – é garantido ao servidor público civil o direito à livre associação sindical;
  • VII – o direito de greve será exercido nos termos e nos limites definidos em lei complementar;
  • VIII – a lei reservará percentual de cargos e empregos públicos para as pessoas portadoras de deficiência e definirá os critérios de sua admissão;
  • IX – a lei estabelecerá os casos de contratação por tempo determinado para atender a necessidade temporária de excepcional interesse público;
  • X – a revisão geral da remuneração dos servidores públicos, sem distinção de índices entre servidores públicos civis e militares, far-se-á sempre na mesma data;
  • XI – a lei fixará o limite máximo e a relação de valores entre a maior e a menor remuneração dos servidores públicos, observados, como limites máximos e no âmbito dos respectivos poderes, os valores percebidos como remuneração, em espécie, a qualquer título, por membros do Congresso Nacional, Ministros de Estado e Ministros do Supremo Tribunal Federal e seus correspondentes nos Estados, no Distrito Federal e nos Territórios, e, nos Municípios, os valores percebidos como remuneração, em espécie pelo Prefeito;
  • XII – os vencimentos dos cargos do Poder Legislativo e do Poder Judiciário não poderão ser superiores aos pagos pelo Poder Executivo;
  • XIII – é vedada a vinculação ou equiparação de vencimentos, para o efeito de remuneração de pessoal do serviço público, ressalvado o disposto no inciso anterior e no art. 39, § 1º;
  • XIV – os acréscimos pecuniários percebidos por servidor público não serão computados nem acumulados, para fins de concessão de acréscimos ulteriores, sob o mesmo título ou idêntico fundamento;
  • XV – os vencimentos dos servidores públicos, civis e militares, são irredutíveis e a remuneração observará o que dispõem os arts. 37, XI, XII, 150, II, 153, III, e 153, § 2º, I (BRASIL, 1999, p.40).
 Organização Jurídica da Administração Pública

 O regime jurídico da administração pública é o conjunto de direitos e deveres que o ordenamento jurídico confere ao Poder Público e que não se estende aos particulares, por força dos interesses que ela representa quando atua, visto que a função administrativa do Estado tem como base de sustentação dois princípios: o princípio da supremacia dos interesses públicos e o princípio da indisponibilidade do interesse público. Ao analisar o art. 37 da CF/88, ver-se que a administração pública pode ser de dois tipos: direta ou indireta, sendo a direta formada por Ministros e Presidentes e a indireta formada por autarquias, fundações, empresas públicas e sociedades de economia mista. Dentro dessa organização jurídica, tem-se que a administração pública é regida sob os princípios de legalidade, moralidade, impessoalidade, publicidade e eficiência. Implicitamente a estes princípios, estão outros, não menos importantes, que são: o princípio da supremacia do interesse público sobre o privado e o princípio da finalidade; da razoabilidade e da proporcionalidade.

 Figura 1: Esquema de organização jurídica da administração pública:

Imagem: Arquivo pessoal. (Favor não usar a imagem sem fazer a devida referência)

O profissional, servidor público, é antes de tudo humano e precisa deleitar-se no exercício de suas atividades profissionais. Esse infelizmente é o investimento mais carente no seio da sociedade e do serviço público, embora se saiba que não se faz o homem apenas com leis, regras e costumes, tão pouco com a profissionalização e o tecnicismo, apesar destes serem fatores importantes em sua formação. É necessário investir no Homem, na sua essência, naquilo que o faz ser. É necessário criar novas estratégias, permanentes e progressivas, para esclarecer a sociedade civil e o próprio servidor, à importância a função pública, mostrando o porquê de sua existência, necessidade e valorização.
O fato é que o serviço público no Brasil ainda tem muito a melhorar, mas mudar o seu conceito só é possível através da mudança de perspectiva do servidor e dos usuários do serviço público, pois a partir do momento em que o indivíduo tem noção de sua importância social, é possível melhorar a qualidade de vida de cada um. Essa mudança só é possível através da educação e do conhecimento, a partir de então, o serviço público tenderá a exercer sua excelência e passará a ser respeitado por toda sociedade.
A ética e a profissionalização são fundamentais para a credibilidade da administração pública. Nessa perspectiva, aperfeiçoar e aumentar o nível de profissionalização e qualificação dos agentes públicos, capacitar e sistematizar as carreiras, é tarefa essencial. No entanto, não se pode deixar de lado a ética em seu sentido do ethos grego, visto que um exemplar agente público é antes de tudo um ser humano, um cidadão que serve ao seu país.
Após vinte e cinco anos da promulgação da CF/88, faz-se de extrema importância que o servidor se revista do espírito público, tornando-se um agente construtor do poder social. Ademais, não basta ingressar no serviço público através de concurso, conhecendo as leis e normas, não basta ser um “concurseiro”. É preciso também a excelência moral e a prática das virtudes para alcançar o desejável e servir com justiça e retidão, exercendo dignamente sua função pública de forma satisfatória para o Estado brasileiro.
Outro fator que deve ser considerado como incluso nessa tríade é a motivação. Motivar é estimular através do investimento na educação do servidor e em sua qualificação profissional, visto que a falta de preparo é um dos fatores que mais preocupa os gestores. A gestão pode e deve ser similar àquela aplicada na iniciativa privada, com responsabilidade, progressão funcional por capacitação e qualificação, onde o ambiente de trabalho seja agradável e salutar, onde os olhos sejam voltados para o futuro, e o passado seja apenas uma referência de como não ser e não agir.
É notório que de 1988 até hoje o serviço público melhorou muito através do ingresso de servidores concursados e melhor qualificados profissionalmente, mas mostrar à sociedade sua importância é uma tarefa que requer anos e um esforço conjunto de todos. A publicação de uma nova LDB contribuiu na formação educacional e a CF/88 concomitante ao RJU contribuíram no sentido jurídico com a elevação da qualidade do servidor, no entanto, muito ainda precisa ser feito no que se refere à qualificação, capacitação e motivação. Nesse prisma, é necessário pensar o homem no sentido de construção de uma humanidade melhor, um homem consciente e responsável, com valores civilizatórios que permitam uma boa e harmônica convivência social. A partir de tais atitudes a gestão deverá fluir melhor e mais facilmente, o que deverá motivar para o desempenho de suas atividades com responsabilidade, eficácia e eficiência. É importante que a gestão seja voltada para o aperfeiçoamento contínuo dos servidores, a disseminação de informações, a formação humana e o planejamento estratégico e participativo, pois de tal forma, todos no serviço público e na sociedade, sairão ganhando.

Texto: Regina Negreiros  –  Servidora Pública Federal do IFPB  |  Bacharel e Licenciada em Filosofia | Especialista em Gestão Pública | Mestranda em Ciências das Religiões.
Fonte do texto: Recortes de seu trabalho de conclusão na especialização em Gestão Pública, com o título:  ÉTHOS, EDUCAÇÃO E SERVIÇO PÚBLICO: Uma tríade basilar na construção de uma sociedade saudável. 
 Como fazer a referência a este trabalho:

NEGREIROS, Regina Coeli Araújo.  ÉTHOS, EDUCAÇÃO E SERVIÇO PÚBLICO: Uma tríade basilar na construção de uma sociedade saudável.  TCC (Especialização em Gestão Pública). Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia da Paraíba – IFPB. João Pessoa, 2014

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