Desde
o fim do tráfico de escravos em 1850, a questão da substituição da mão-de-obra
escrava nas lavouras de café tornou-se uma questão crucial para os
cafeicultores. Foi no Estado de São Paulo, onde se localizava o núcleo dinâmico
da economia cafeeira, que foram tomadas as medidas concretas para viabilização
da importação de mão-de-obra através de financiamento público. A
estratégia da aristocracia cafeeira foi
prolongar ao máximo a manutenção da escravidão através de sua extinção lenta e
gradual, que começa com a proibição do tráfico em 1850 e só terminará quase
quarenta nos depois em 1888 com a abolição. Por outro lado, paralelamente ao trabalho à manutenção do trabalho escravo,
os produtores foram articulando uma política de substituição de mão-de–obra
através da imigração estrangeira.
Esse
processo de substituição de mão-de-obra escrava pela mão de obra imigrante foi
tratado por parte da historiografia como duas formas de trabalho isoladas que,
de certa forma, se opunham e que não conseguiram conviver entre si. Nessa
concepção a escravidão dificultaria e até entravaria o processo de formação do
proletariado como classe. Esse pressuposto está longe de ser verificada como
podemos atestar em vários exemplos em que até mesmo em fábricas, as duas formas de trabalho podiam
coexistir. Por exemplo: “Dos operários registrados nas manufaturas do Rio de
Janeiro entre os anos de 1840 a 1850 – especialmente nas fábricas de vidro,
papel, sabão, couros, chapéus e têxteis -, 45% eram escravos. Além disso, o
recenseamento de 1872 apontou que no Rio de Janeiro havia mais de dois mil
operários cativos empregados em pequenas fábricas”. (NEGRO & GOMES. 2007.
p. 63)
Nesse
sentido, ao pensarmos a formação da classe trabalhadora brasileira, temos que
pensá-la como fenômeno histórico em termos da sua heterogeneidade e complexidade própria da sociedade brasileira. Dito de
outra maneira, a classe trabalhadora desde a sua formação é constituída por
negros, mestiços, índios - homens e mulheres - que viviam nas cidades e no
campo com culturas distintas que
expressaram suas demandas através de lutas concretas contra a opressão e a
exploração.
A
greve dos tipógrafos do Rio de Janeiro ocorrida em 1858 é tida como a primeira
greve do país. No entanto, João José Reis assinala que em 1857 ocorreu uma
greve de escravos em Salvador na Bahia
que ele denominou de “Greve Negra”. A paralisação que envolveu centenas de
escravos “ao ganho”[1]– na sua maioria africanos “nagôs”- durou duas
semanas interrompendo os serviços de abastecimento e transporte do porto. Os
grevistas protestavam contra a determinação da Câmara Municipal que exigia
mudanças na lei que interferiam nas relações senhor e escravo e na forma de
organização do trabalho. No mesmo ano, os trabalhadores escravizados
pertencentes ao Barão de Mauá se recusaram a trabalhar na fábrica Ponta D’Areia
que era um dos maiores estabelecimentos do Rio de Janeiro, com cerca de dez
oficinas e 600 operários, sendo 150 deles escravos. Ainda como Observam Antonio
Negro e Flávio Gomes: “São várias as
evidências de paralisações feitas por escravos nas indústrias. No final da
década de 1820, cativos, africanos livres e outros trabalhadores param a
fábrica de Pólvora Ipanema, controlada pelo Estado Imperial. Reivindicavam
melhorias nas condições de trabalho, como diárias e dieta alimentar. No Rio de
Janeiro em abril de 1833, um levante numa calderaria trouxe apreensão, com
escravos enfrentando a força policial havendo tiros e mortes”
Trazemos
o relato dessas lutas porque são questões importantes para a formação política
dos militantes, assessores e dirigentes sindicais. Pois se trata antes de tudo
em reconhecer os escravos como trabalhadores dotados de autonomia e
protagonismo social no cotidiano das suas terríveis condições de trabalho.
Para
Saber mais:
Negro,
Antonio Luigi e GOMES, Flávio dos S. As greves antes da “Greve”. Revista
Br-História. Ano 1 n. 2, 2007.
REIS,
João. A greve negra de 1857 na Bahia.
In: Revista USP, nº 18, 1993.
GOMES,
Flávio dos Santos. Histórias de quilombos Mocambos e comunidades de senzalas
no Rio de Janeiro, século XIX. Rio de Janeiro, Arquivo Nacional, 1995.
DOMINGUES, Petrônio. Uma história não contada
negro, racismo e branqueamento em São Paulo: editora Senac 2005
VITORINO,
Artur José R. Máquinas e operários – mudança técnica e sindicalismo gráfico
(São Paulo e Rio de Janeiro – 1858-1912). São Paulo, Fapesp/Anablume, 2000.
[1]
Escravos que alocavam
seus serviços no mercado: carregadores, vendedores ambulantes, quitandeiras
obrigando-se a dar uma parte dos seus ganhos ao seu senhor.
Fonte: https://cut.org.br
Fonte: https://cut.org.br
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