Organização e Representação Sindical de Base
MÓDULO II
Autores:
Ana Paula Melli
Hélio da Costa
Lenir Viscovini
Nesta versão com a colaboração
APRESENTAÇÃO
O eixo temático deste caderno é o novo sindicalismo e a fundação
da CUT, ou seja, o cenário político do final dos anos 70, com novos personagens
sociais e novas práticas, valores e representações que mudaram o rumo do
projeto de “redemocratização” traçado pelo regime à época da transição lenta,
gradual e segura.
Assim, ao contrário do que fazem os historiadores tradicionais, a
história da CUT é apresentada aqui como processo, com escolhas difíceis,
carregadas de despreendimento e determinação e, ao mesmo tempo, com contradições
que ainda hoje nos acompanham. É o caso da estrutura sindical oficial, cujos
pilares ainda persistem apesar dos avanços e conquistas do novo sindicalismo e
da CUT.
Os impasses no interior do movimento sindical nos difíceis anos de
chumbo não foram poucos. É importante destacar que os blocos sindicais que se
faziam presente no período da fundação da CUT tomaram, nesses 30 anos, caminhos
próprios e controversos. Assim, a pluralidade que temos hoje, pelo menos no que
diz respeito às centrais sindicais, não pode ser definida como uma nova
realidade sem qualquer relação com o passado.
O caderno não tem a pretensão de responder a todas as questões que
desafiam nossos quadros dirigentes de hoje, mas pode contribuir com a reflexão
necessária sobre as relações entre concepções e ações do passado e do presente
dos diferentes grupos ou tendências que, a seu modo, disputavam a direção do
movimento sindical brasileiro, tal como no capítulo “As articulações sindicais e a fundação da CUT”, que traz elementos
para uma profunda reflexão sobre a relação entre as diferentes centrais
sindicais de hoje e os agrupamentos sindicais da época: unidade sindical que reunia sindicalistas sob a influência dos
partidos de esquerda do passado; os
sindicalistas independentes ou autênticos, que tinham Lula como principal liderança; as oposições
sindicais; e os
ativistas
de extrema esquerda.
Assim, a compreensão do novo sindicalismo exige ir além do
conhecimento da história das lideranças e dos acontecimentos, pois se trata de
um processo sem paralelo na história do Brasil, embora guarde relações com
passado de lutas do povo brasileiro. A diferença fundamental está nas práticas
e significados de uma “nova esquerda” que já não é mais representada por uma vanguarda
portadora de saberes e teorias pré-elaboradas.
O caderno procura evidenciar que estas novas práticas e novos
discursos agora são elaborados por dirigentes formados pelos próprios
sindicatos e movimentos populares, no enfrentamento direto com o capital e com
o estado. Pretende também, provocar uma reflexão sobre como estas novas
práticas e novos discursos se articularam nacionalmente, criando as condições
necessárias para a fundação da CUT.
A leitura crítica da nossa história é condição necessária para que
possamos construir novas alternativas à cultura neoliberal que domina os
aparelhos do estado e sociedade. Parte desse desafio diz respeito à reflexão sobre
nossas próprias organizações, pelo menos se o objetivo visa a atualização do
projeto sindical da CUT.
Portanto, o objetivo do caderno é contribuir para o fortalecimento
das nossas utopias sobre um novo padrão de desenvolvimento e de relações
sociais, com igualdade, justiça e direitos para todos, tarefa maior do trabalho
da formação sindical.
Boas Reflexões.
PARTE I
Os novos
movimentos sociais: anos 70 e 80 no Brasil
“...nenhum modo de produção,
nenhuma ordem social dominante e portanto nenhuma cultura dominante, nunca, na
realidade, inclui ou esgota toda a prática humana, toda a energia humana e toda
a intenção humana”.
Raymond
Williams
O período dos anos
setenta no Brasil, como sabemos, não era propício para ações políticas, nem
individuais, tampouco coletivas. Vivíamos em plena ditadura civil-militar,
instaurada no país em 1964, que impôs um regime sustentado pelo uso da força e da
repressão política sobre todas as formas de liberdade humana. Mas é justamente
neste período - segunda metade dos anos setenta – que emergem diversos
movimentos sociais na cena política brasileira. Eram movimentos populares que
não constituíam sujeitos políticos homogêneos, ao contrário, se caracterizavam
pela heterogeneidade e diversidade e reivindicavam inúmeras causas. Essas
reivindicações que definiam coletividades que passavam pelas lutas travadas
pelos sindicatos, pelos moradores de bairros, pelas mulheres, pelos negros,
pelas comunidades de base ligadas a igreja, pelos índios, pelos trabalhadores
rurais, etc. As causas em torno das quais tais movimentos se estruturaram eram:
- direito
a liberdade e autonomia dos sindicatos,
-
direito a greve
-
direito a igualdade de condições para mulheres
trabalhadoras
-
direito a moradia
-
direito a creches
-
direito a saúde
-
direito a distribuição das terras aos sem-terras
-
direito a educação
Devido a sua forma
autônoma de organização coletiva, que os distinguia de outros períodos da
história, foram logo chamados de “novos movimentos sociais”. É possível dividir a chegada dos novos
movimentos populares entre aqueles que surgiram nos anos setenta onde os
sujeitos desses movimentos se constituíam por grupos de operários fabris e
grupos de moradores de bairros, e aqueles que surgem na década de oitenta,
grupos estes que já tinham trajetórias em períodos anteriores, como o movimento
de mulheres, o movimento negro e os movimentos rurais e indígenas. Em todos eles
foi possível identificar “um sentido inovador” que de acordo com Paoli (1995,
p.31) tinha por objetivo construir novas referências para a sociedade “em
relação à singularidade de diferentes condições sociais antes anônimas como
dimensão política”. Estes segmentos ou grupos, cada qual a seu modo, - mas
todos organizados de forma autônoma - vão criar espaços coletivos para discutir
suas necessidades e interesses que irão influenciar e alterar a dinâmica da
sociedade.
Esses
movimentos populares ao reivindicarem, protestarem e atuarem não expressavam
apenas uma reação contra a ditadura; resumir as suas ações a esta reação seria
desconsiderar o caráter reivindicativo e de exigência ao atendimento de suas
necessidades concretas e deixar de lado
a luta pela ampliação do acesso ao espaço político e aos benefícios econômicos; a ação dos movimentos era forte
naquilo que expressavam enquanto interesses e necessidades econômicas e
políticas.
NOVOS
SUJEITOS E NOVAS PRÁTICAS POLÍTICO-CULTURAIS NA SOCIEDADE BRASILEIRA
O que
caracteriza e define os novos movimentos da década de setenta é o que designou
Sader (1995, p.143, 144) como sendo “novas configurações sociais assumidas
pelos trabalhadores” através de “novos padrões de ação coletiva” e o que
permitiria falar na “emergência de novos sujeitos”. Sader, analisando as experiências e lutas dos
trabalhadores da grande São Paulo entre 1970 e 1980, identifica que nas lutas
sociais deste período os sujeitos envolvidos elaboravam representações sobre os
acontecimentos e sobre si mesmos e para essas reelaborações recorriam a
matrizes discursivas constituídas, de onde extraíam referências para a prática
cotidiana. Para o autor, pode-se identificar na década de setenta a presença de
“três agências” ou “centros de elaboração discursiva” que visavam o cotidiano
popular. Essas agências passam a reelaborar o cotidiano popular na ótica de uma
luta contra as condições dadas. Neste sentido, o autor aponta três instituições
em crise que abrem espaços para novas elaborações, tendo cada uma delas
experimentado a crise sob a forma de um descolamento com seus públicos
respectivos; essas agências buscam novas vias para reatar suas relações.
Vejamos quem são elas e como surgem:
-
Da igreja Católica, sofrendo a perda de
influências junto ao povo, surgem as comunidades de base.
-
De grupos de esquerda desarticulados por uma
derrota política, surge uma busca de ‘novas formas de integração com os
trabalhadores’.
-
Da estrutura sindical esvaziada por falta de
função, surge um ‘novo sindicalismo’.
De acordo
com Sader (1995, p.143,144), tanto a incidência social quanto a consistência
argumentativa eram desiguais nas três agências, segundo o autor:
“a
matriz discursiva da teologia da libertação, que emerge nas comunidades da
igreja, tem raízes mais fundas na cultura popular e apóia-se numa organização
bem implantada. (...) A matriz marxista não dispõe dessa base, enfrenta uma
profunda crise e ainda os grupos que a sustentavam vinham de uma derrota
desarticuladora; ela traz, no entanto, em seu benefício, um corpo teórico
consistentemente elaborado a respeito dos temas da exploração e da luta sob (e
contra) o capitalismo. A matriz sindicalista não extrai sua força nem das
tradições populares nem da sistematicidade teórica, mas do lugar institucional
em que se situa lugar constituído para agenciar os conflitos trabalhistas.”
Importante
dizer que apesar da divisão das agências/matrizes, os sujeitos, naquele
contexto histórico se encontravam e interagiam nos diferentes espaços
instituídos das lutas dos respectivos movimentos. Um exemplo disso é que não
eram poucos os sujeitos que ligados às estruturas sindicais também atuavam nas
comunidades de base da igreja. Também cabe lembrar nesse mesmo sentido que os
grupos de esquerda (marxistas) atuavam por meio de suas práticas inserindo-se e
integrando-se nos diversos movimentos ligados à igreja e ao movimento sindical.
Verifica-se
então, a partir desses referenciais, neste período, a formação de várias
coletividades que a partir de suas necessidades expressavam seus interesses e
ao mesmo tempo buscavam construir suas identidades enquanto grupo. Os
movimentos sociais tiveram de construir suas identidades enquanto sujeitos
políticos precisamente porque estas eram ignoradas nos cenários públicos
instituídos; basta considerar que não
havia liberdade de expressão no país. Não havia na sociedade espaço algum de
participação política para esses sujeitos, seus anseios não encontravam nenhum
canal público de comunicação, além daqueles tradicionais; a família, os vizinhos,
os amigos.
As
necessidades e as carências reivindicadas pelos movimentos podem ser definidas
de diferentes modos e níveis o que dava aos movimentos de acordo com Durham
(1984, p.27) formas “muito flexíveis de mobilização” e que levaria a operarem
“... cortes muito diversos uns dos outros, definindo coletividades de tipo
muito diferente”. Para alguns essa diversidade significava um problema, uma vez
que conduziria a fragmentação da luta geral, seria mesmo um empecilho para a
universalização dos interesses e dos direitos. Podemos dizer então que os
movimentos emergiam fragmentados e de acordo com Sader (1995, p.198) se
reproduziam enquanto formas singulares de expressão “... embora tenham
desenvolvido mecanismos de coordenação, articulação, unidade, eles se
mantiveram como formas autônomas de expressão de diferentes coletividades, não
redutíveis a alguma forma ‘superior’ e ‘sintetizadora’”. Para as coletividades
construídas o importante era buscar a unidade da luta na diversidade cultural.
Esta diversidade dos movimentos populares até a década de setenta havia
passado, em sua maioria, pela ação unificadora do Estado, de partidos ou pela
própria esquerda (considerada vanguarda dos trabalhadores), que determinavam
segundo seus interesses os lugares e as vozes dos sujeitos. A esta ação e
interferência externa (Estado, partido) os movimentos resistiam com toda força,
uma vez que as experiências anteriores haviam apontado os problemas dessa
atuação. A esquerda atuante nos mais diversos movimentos populares repensava
neste momento histórico as suas práticas e teorias reinterpretadas agora como
muito “centralizadoras”, buscando “novas formas de integração com os
trabalhadores” para a realização da ação política. Ainda que essa luta política dos movimentos
possa ser identificada como plural, fragmentada e até mesmo contraditória,
essas contestações e ação não devem ser entendidas como subprodutos das lutas
políticas, mas como constitutivas dos esforços dos movimentos sociais para
redefinir o significado da atuação, reivindicação e participação política na
sociedade.
Ao atuarem
nos mais variados espaços em nome de causas diferenciadas, os movimentos
populares foram construindo caminhos alternativos para a participação política.
Conforme analisa Carvalho (1998, p. 9), na inexistência de espaços públicos
para discussão das diversas demandas sociais e dos conflitos “... o cotidiano,
o local de moradia, a periferia, o gênero, a raça tornam-se espaços e questões
públicas, lugares de ação política, constituindo sujeitos com identidades e
formas diferentes daquelas do sindicato e do partido”. Nem por isso a luta foi
menos importante, ao contrário, os movimentos populares inventaram-se sujeitos
ampliadores da própria esfera da política, tão reduzida aos meios
institucionais e palacianos do poder. Demarcaram a importância do espaço local
ou do “poder local” como forma concreta de realizar a ação política.
Trata-se então, de um
período novo e um marco na história da organização popular no Brasil, com uma
ampliação e pluralização de movimentos sociais que vão se posicionar em busca
de seus direitos e de seu lugar na política e na história. O elemento novo na
década de setenta será então o caráter, já citado, de autonomia de organização
dos sujeitos seja em relação ao Estado seja em relação a partidos políticos. Os
movimentos criaram uma “cultura participativa e autônoma” que se multiplicaram
pelo país, nos bairros, nos campos, nos sindicatos, onde os sujeitos coletivos
apareciam para expressarem suas vontades, necessidades e interesses políticos.
Num primeiro momento,
podemos dizer que os movimentos populares lutaram pelo acesso aos direitos
sociais básicos, como o direito à educação, a moradia, a saúde, etc, mas essa
noção aos poucos foi sendo ampliada à medida que passaram a lutar também “pelo
direito a participar da redefinição dos direitos”, ou seja, quando travaram
também uma luta política contra a cultura autoritária e excludente da sociedade
brasileira. Quando passaram a incorporar em sua prática social a necessidade de
realização de mudanças culturais na sociedade, como sendo um elemento
fundamental para o processo de democratização e participação ativa na
sociedade. De acordo com Paoli (1995, p.42), os movimentos sociais e sua fundamental reivindicação do “direito a ter
direitos” - elaborada por diversos sujeitos antes ocultos por uma sociedade
autoritária e excludente - invadiam e modificavam o sentido estrito da
transição democrática”. Podemos perceber aqui a conexão entre cultura e política
como constitutivas da ação coletiva dos movimentos populares. A luta que era
por necessidades básicas, simbolizadas por reivindicações específicas
aprofunda-se através da percepção dos movimentos de que para além das
conquistas imediatas ou mesmo para garanti-las e ampliá-las era preciso tentar interferir e alterar os parâmetros sociais
estabelecidos pela cultura dominante. Cultura essa da não participação, da
exclusão das classes desfavorecidas no espaço público.
Neste sentido, podemos
dizer que a originalidade dos movimentos sociais da década de setenta e oitenta
consiste também no fato de que ao se organizarem em torno do direito a
liberdade e a participação política eles ampliaram a questão da cidadania,
fazendo-a passar do plano político institucional ao da sociedade como um todo,
entendendo a cidadania como participação política ativa na sociedade, como
interferência política. As suas
reivindicações coletivas não eram pela tomada do poder reduzido ao poder do
Estado, mas conforme aponta Chauí (1993, p.62), “a luta pelo direito de se organizar
politicamente e de participar das decisões”. Entendia-se que o poder estava em
todos os lugares a ser preenchido por meio da ação política travada pelos
vários movimentos. A luta organizada não era nesse momento pela tomada do
poder, mas para a conquista do poder presente nos espaços da sociedade civil,
seja no bairro, na escola, no sindicato, na fábrica, etc. Essa reivindicação
visava romper com a estrutura hierárquica do poder autoritário da sociedade.
As novas práticas
sociais inauguradas pelos movimentos populares redefiniram o espaço da
política; fazer política não estava mais restrito ao Estado e aos partidos. Ao
lutar por direitos, os novos movimentos se colocavam tanto contra as relações
desiguais entre governantes e governados – aqueles que teriam o poder contra
aqueles que em tese não teriam poder algum -
como contra o autoritarismo das próprias relações cotidianas. Nesse
sentido, os movimentos sociais questionaram o próprio lugar ou lugares em que
está o poder na sociedade.
Cabe considerar ainda
que, ao lutar pelos seus direitos e pela ampliação dos mesmos, os movimentos
sociais mantinham nos anos setenta uma posição antagônica e de resistência ao
Estado autoritário e que com o processo de democratização da sociedade, já na
década de oitenta - no qual a presença e interferência dos movimentos populares
foi marcante e definidora -, essa relação muda e muitos movimentos passaram a
atuar nos novos canais institucionais do poder público. Isso se intensificou e
ampliou-se com o processo Constituinte em 1988 e no decorrer da década de
noventa, onde tornou-se cada vez mais evidente e intensa a participação dos
movimentos sociais na reivindicação de “participar da redefinição dos direitos”
e da “gestão da sociedade”. Esse momento marca uma segunda fase dos movimentos sociais, que é sua
institucionalização, e do refluxo de atuação dos movimentos sociais em nossa
sociedade; questão essa que não aprofundaremos aqui.
Cabe considerar que através
dessas lutas e desse processo, aqueles que sempre estiveram distantes dos
espaços de decisão política, os de “baixo”, puderam se apresentar com suas
propostas e projetos em espaços de poder antes inexistentes, como os espaços
criados por governos do campo democrático e popular, em geral em administrações
municipais do Partido dos Trabalhadores. Nesse período, muitos movimentos
sociais passaram a ter voz e voto em conselhos e fóruns, contribuindo
diretamente para que a democracia fosse alargada, com participação direta e com
a conquista de novos direitos.
Desta forma, ao se falar
dos avanços alcançados no processo de democratização da sociedade e na
construção de espaços públicos é preciso considerar a inegável presença e
participação ativa dos movimentos populares na luta por liberdade, justiça e
igualdade social. A história mostrou que, mesmo com os riscos inerentes a
fragmentação, essa dinâmica dos movimentos sociais teve papel decisivo na
construção de novos parâmetros sociais, imprimindo ritmos diferenciados que
levaram, apesar de todos os limites do processo, a alterações importantes na
prática política e cultural da sociedade brasileira.
Segundo o contexto descrito, o movimento
social teve três matrizes. Que matrizes foram estas e de que forma isso explica a pluralidade de
posições políticas no interior dos movimentos, como por exemplo o movimento
sindical?
As reivindicações dos movimentos sociais
ultrapassaram as barreiras das pautas sindicais. Como o grupo percebe a ação
sindical voltada para as demais áreas da vida social em seus sindicatos?
PARTE II
As origens do novo sindicalismo
As greves
que mobilizaram milhares de trabalhadores no final dos anos 70 marcam um
período de mudança histórica no movimento sindical brasileiro. Porém, nem mesmo
os protagonistas daquele momento, por mais otimismo que carregassem em suas
mentes e corações, jamais imaginariam que estariam imprimindo uma marca tão
significativa no sindicalismo brasileiro que mudaria definitivamente a história
política do país.
O ponto
inicial desse ciclo de lutas é a greve na fábrica Saab Scania do Brasil,
deflagrada no dia 12 de maio de 1978. É nesse momento que o “novo sindicalismo”
emerge na cena política do país chamando a atenção de amplos setores da
sociedade, por meio do Sindicato dos Metalúrgicos de São Bernardo do Campo.
O relato da
greve aponta para o clima de insegurança e medo que cercava o ambiente sindical
daquele período e se refletia nas ações dos militantes e dirigentes sindicais,
que começavam a enfrentar de maneira mais aberta o regime militar:
Começou a ficar aquele clima
dentro da fábrica, no sindicato, nas assembléias. Clima assim de greve. Mas,
não se falava a palavra greve. Falar a palavra greve assustava {...} mas, o
clima continuava, aquele clima pesado...
Então surgiu da parte da
gente: que tal a paralisação? Para que a gente reivindicasse, exigisse o
salário. Aí muitos falavam: Vocês não viram em 77, a ferramentaria começou a
pressionar, e conseguiram?
Mas a palavra greve é que
estava difícil de sair. Então, o pessoal propôs parar dentro da fábrica. Parar,
mas não era greve. Era uma parada. Então, a gente saía pelas seções, os
companheiros mais conscientes, e começaram a conversar: que tal uma
paralisação? Vamos parar aí, que você acha e tal. Aí fomos vendo que o pessoal
ia topando e nós íamos pedindo a esses companheiros que toparam de cara,
principalmente os da ferramentaria, para fazerem contato já com outro pessoal[1].
Depois da Scania, outras
empresas são atingidas pela greve, como a Mercedes Benz, a Ford, Motores
Perkins etc, as paralisações chegam até as cidades vizinhas como Santo André,
São Caetano e São Paulo. Governo e patrões adotam uma política de
inflexibilidade diante das reivindicações dos trabalhadores. As empresas que
tinham sinalizado com a possibilidade de negociação, como a Mercedes e a
Scania, foram obrigadas a recuar nas suas intenções, pressionadas pela ANFAVEA
(Associação Nacional de fabricantes de Veículos Automotores).
A disseminação das greves em
1978, num claro enfrentamento contra o regime militar criou uma divisão nítida
no movimento sindical:
-
Um
pólo combativo de militantes das oposições sindicais e novos dirigentes que
defendiam a mobilização, a organização autônoma dos trabalhadores e o
enfrentamento através da greve, quando necessário.
-
Outro
pólo, composto por dirigentes sindicais, que estavam acomodados na estrutura
sindical e que se viam ameaçados pela combatividade das oposições.
-
E
um terceiro segmento, formado por militantes e dirigentes ligados a
agrupamentos da esquerda (especialmente do Partido Comunista Brasileiro), que
apesar de reconhecer a legitimidade das demandas dos trabalhadores, achavam que
o momento político vivido pelo país era muito delicado e a prioridade da agenda
da nação era a garantia da abertura democrática e, portanto, o momento não era
de confronto, o que não significou, por sua vez, que não dessem apoio as lutas
operárias.
Embora a ocorrência de greves
não fosse um acontecimento ausente da cena sindical, o fato é que a greve na
Scania teve um significado muito maior do que qualquer greve de fábrica ocorrida
ao longo dos difíceis anos 70.
Assim, o sindicato procurava
combinar várias práticas de resistência no interior da fábrica, numa
contraditória vivência das condições de trabalho, “um novo tipo de ação
sindical que procurava utilizar ao máximo as limitadas possibilidades da
institucionalidade existente e, ao mesmo tempo, questioná-las” (Abramo.
1999:179). Essa percepção por parte do Sindicato dos Metalúrgicos de São
Bernardo e Diadema de que uma nova conjuntura muito mais desafiadora havia se
descortinado para o sindicalismo brasileiro e que os dirigentes sindicais se
defrontavam com difíceis escolhas que não mais poderiam ser adiadas.
O fato de estar localizado no
centro dinâmico do capitalismo brasileiro e concentrar na sua base de
trabalhadores as principais montadoras do país, colocou o Sindicato dos
Metalúrgicos de São Bernardo no epicentro dessa nova conjuntura sindical. Ao
incorporar para dentro do sindicato as reivindicações operárias daquele
importante setor, que permaneceram reprimidas durante anos seguidos, os
sindicalistas metalúrgicos de São Bernardo surpreenderão o país no ano seguinte
ao liderarem a greve geral da categoria que mudará definitivamente os rumos do
sindicalismo brasileiro.
Outro desdobramento importante das
Greves de 1978 foi à eleição para a direção do Sindicato dos Metalúrgicos de
São Paulo, o maior sindicato de trabalhadores da indústria da América Latina. A
oposição sindical metalúrgica que através de um persistente trabalho de
organização dos trabalhadores nas fábricas durante vários anos, havia
conquistado a maioria dos votos da base metalúrgica, porém, ao se dividir em
duas chapas, a oposição dispersou energias decisivas, mas mesmo assim a chapa 3
da oposição aparecia como favorita à vitória no pleito eleitoral.
No entanto, a chapa da situação
encabeçada por Joaquim dos Santos Andrade, o Joaquinzão, que se consagrou como
o dirigente-símbolo do peleguismo sindical naquela conjuntura de polarização do
sindicalismo brasileiro, não sem motivos, porque ele e seus correligionários
não economizaram no exercício das práticas fraudulentas, que contaram com a
anuência do Ministro do Trabalho, Arnaldo Prieto, que deu posse a Joaquinzão,
apesar do pleito ter sido impugnado por constatação de fraude. Esse episódio
foi registrado no filme Braços cruzados, máquinas paradas de Roberto
Gervitz e Sérgio Toledo Segal.
O saldo das greves de 1978 não se
encerrou com a derrota da oposição metalúrgica em São Paulo. Além de várias
fábricas paradas em novembro daquele ano, a oposição metalúrgica organizará a greve geral da categoria no ano
seguinte, que a exemplo do que ocorrerá no ABC paulista, marcará a conjuntura
política do país.
Mas antes de descrevermos as
greves que envolveram dezenas de milhares de trabalhadores em 1979 e 1980 e que
mudaram a face política do país, é
importante resgatarmos o período antecedente, pois afinal, as greves não são
acontecimentos que ocorrem como fruto do acaso, em geral, elas são precedidas
de um trabalho cotidiano de organização e mobilização realizado por militantes,
ativistas e dirigentes, que muitas vezes passam desapercebidos dos registros e
da história por atuarem nos “bastidores”. Nesse sentido, faremos um breve
relato da resistência operária nos anos de chumbo.
·
Quais
principais lutas e greves aconteceram no seu estado ou cidade?
·
Relate
o ano, as reivindicações, o desenvolvimento e o resultado dos movimentos.
·
Descreva
o que estes movimentos significaram para sua militância?
Resistência silenciosa dos militantes
sindicais no período da ditadura militar
As greves de massa foram
antecedidas por uma persistente luta cotidiana dos militantes sindicais de
vários agrupamentos da esquerda e da igreja católica que atuavam nas fábricas.
Essas ações cotidianas foram uma espécie de resistência silenciosa à Ditadura
Militar que atravessou um período de intensa repressão, especialmente a partir
de 1968 depois das greves de Osasco. A partir de meados de 1970, a militância
vai se rearticulando aos poucos e recupera antigas formas de organização, ainda
de maneira muito cuidadosa e clandestina como forma de driblar a repressão.
Primeiro procurava-se mapear
quais eram os problemas da fábrica que mais afligiam os trabalhadores e, então,
procurava-se focar a luta em cima desse problema. Em algumas fábricas era a
insalubridade a principal reclamação dos trabalhadores, noutras, eram os
salários, e assim por diante.
Também se fazia o
levantamento da fábrica do ponto de vista econômico e político. Por exemplo:
qual grupo econômico pertence, qual sua situação no mercado, quais os pontos
mais vulneráveis e as seções mais estratégicas; principais fornecedores e
compradores, etc. Do ponto de vista político-sindical, eram pesquisados a
tradição de luta dos trabalhadores da empresa (se havia ou não), número de
sindicalizados, relação dos trabalhadores com o sindicato, etc.
Depois de algum tempo dava-se
início ao trabalho de agitação e propaganda, dentro das possibilidades e
limitações que a conjuntura política impunha. Por exemplo, eram elaborados
“papagaios” e “mosquitos” pequenos pedaços de papéis com palavras-de-ordem que
eram colados nas portas dos banheiros, vestiários, bebedouros, nas máquinas,
etc. Apesar dos riscos, também se fazia panfletagem dentro da fábrica com
pincel atômico e giz.
Os militantes não podiam
abrir mão do mais antigo e eficiente instrumento de convencimento, que é o
velho e bom bate-papo, que proporcionava os primeiros contatos e a verdadeira
percepção dos que os trabalhadores realmente pensavam sobre o mundo do trabalho
e sobre a visão de mundo mais geral.
Na medida do possível também
se procurava vincular o trabalho na fábrica com o trabalho no bairro. Era uma
forma de contornar a repressão e ao mesmo tempo ampliar fortalecer o trabalho
de organização dos trabalhadores. Desta forma, eram mapeados os bairros onde se
concentravam a maioria dos trabalhadores das empresas e também que tipo de
organização preexistente havia no bairro, como: Associação de bairro; Igreja;
clube esportivo, time de futebol. Não foi por acaso, que muitas lideranças
sindicais que se destacaram nos final dos anos 70 e início dos anos 80 eram
também lideranças nas suas respectivas comunidades atuando em diversos espaços
do bairro.
E assim nos duros anos de
chumbo da Ditadura foi se construindo uma história de luta de resistência que
ainda está por ser recuperada, e, que só chegou até nós, através dos
depoimentos dos antigos militantes que protagonizaram essa história, como é o
caso Raimundo Périllat, membro da pastoral operária e metalúrgico aposentado,
que narra a greve ocorrida na Indústria Villares em 1973, na zona sul de São
Paulo:
No início dos anos 1970, durante três anos,
militantes da fábrica Villares, localizada na Zona Sul de São Paulo, preparam
uma greve. Uma das primeiras ações foi realizar uma pesquisa – clandestina, claro
– sobre o custo de vida e salários. O objetivo era medir o nível de
comprometimento e combatividade no caso de uma greve ou mesmo uma operação
tartaruga. Vale lembrar que nos bairros crescia o Movimento Contra a Carestia,
organizado principalmente pelas mulheres.
O que facilitou a realização
e o sucesso da greve foi a presença de vários operários “velhos”, com
experiência de luta daqueles anos recentes. A exploração e os salários baixos determinam a decretação
do movimento grevista com a adesão de todos os operários, durante o dissídio
coletivo de 1973, no segundo semestre.
No primeiro momento da greve
não houve vitórias econômicas. Mas os operários que ficaram na fábrica
continuaram com a operação tartaruga. Um mês depois, a empresa convocou o restante
da comissão e outros para negociar[2].
O resultado dessa greve foi
início do trabalho chamado pelos companheiros da oposição metalúrgica de inter-fábricas.
Eram encontros de trabalhadores de várias fábricas de várias regiões. O
trabalho clandestino ganhou novo impulso. Os demitidos se empregavam em outras fábricas e a semente
do trabalho de base se espalha por toda a categoria..
Esquerda Revolucionária
e Igreja Católica
Na ditadura
militar, o autoritarismo cerceia todas as formas de expressão da sociedade
civil. São fechados quase todos os canais antes disponíveis de representação da
classe trabalhadora. No movimento sindical, este fato se evidencia com a
intervenção ocorrida nos sindicatos. Em uma grande parte deles, logo após o
golpe militar de 1964, o exército destruiu a documentação histórica de diversas
categorias e depôs as diretorias representativas das categorias.
No plano
político partidário, a cassação de mandatos de parlamentares progressistas, a
intervenção nas administrações públicas, a prisão, tortura e assassinato de
dirigentes e militantes de movimentos de esquerda, são também um bom exemplo
das formas de pressão utilizadas pelo Estado. Portanto, se por um lado o Estado
asfixiou os espaços de expressão autônomos da sociedade civil, principalmente
da classe trabalhadora, a sociedade por outro, procurou elaborar suas formas de
resistência e auto-representação.
Uma das
maneiras encontradas pelos movimentos de esquerda para enfrentar a ditadura
militar a partir dos locais de trabalho foi à organização de Oposições
Sindicais, que de modo geral foram compostas por organizações políticas, tais
como:
- as de matriz
marxista, como Movimento de Emancipação do Proletariado (MEP), Ala Vermelha do
PC do B (ALA), Partido Comunista Brasileiro (PCB), Política Operária (PO) e
Partido Comunista do Brasil (PC do B);
- as de matriz católica
como a Ação Católica Operária e a Juventude Operária Católica.
A forma mais
recorrente de atuação nas oposições sindicais era por meio da entrada de
militantes nas fábricas como operários. Dava-se preferência às fábricas que
tivessem uma grande concentração de trabalhadores (as maiores fábricas), que
eram principalmente os estaleiros (EMAQ, ISHIBRAS e VEROLME) e a General
Eletric no Rio de Janeiro ou fábricas como Volkswagen e Ford em São Paulo.
Esses novos operários eram em geral jovens de classe média,
estudantes/militantes universitários que atuavam em algumas dessas organizações
políticas, que iriam então se "proletarizar" (isto é, tornaram-se
operários com finalidades políticas).
Os
"quadros" (militantes das organizações) tinham como função organizar
a classe trabalhadora em suas bases, nos locais de trabalho e, convencê-los a
fazer a revolução e superar a sociedade capitalista. Nessa concepção, a fábrica
era considera o espaço onde a exploração do trabalho apresentava a sua face
mais concreta e a luta sindical, como formação na prática, era o estágio
necessário para que o trabalhador tomasse consciência das mazelas do
capitalismo: baixos salários, autoritarismo das chefias, péssimas condições de
vida.
A atuação no
movimento sindical via oposição, era uma das formas encontradas pelos grupos de
esquerda clandestinos, para "acelerar o processo revolucionário” (C.
Frederico, 1987). As oposições eram o espaço privilegiado de atuação, pois
"os sindicatos foram criados e estruturados pelo Estado
burguês-latifundiário para que a classe dominante pudesse controlar e dominar o
proletariado, não como instrumento de luta da classe operária e sim para evitar
a luta" (C. Frederico, 1987). Portanto, eles buscaram uma outra via de
acesso às bases,que era seu principal
objetivo. As oposições se comprometiam com a criação de organizações de base,
comitês de empresas, conselhos de representantes de fábricas junto às
diretorias sindicais.

Grupos de Oposição e Vida Sindical
A atuação em bases operárias tinha uma importância
fundamental para as organizações da esquerda brasileira. Como sabemos, na
matriz marxista, a classe operária é a classe revolucionária que derrotará o
capitalismo, portanto, cumpria aos militantes o dever de conscientizar o
proletariado de seu papel revolucionário. Essa concepção ganhou um grande
impulso. Historicamente, foram os revolucionários russos, liderados por Lênin,
que disseminaram esse modelo de organização que valoriza o papel de uma
Vanguarda Revolucionária, composta por membros conscientes politicamente,
disciplinados partidariamente e dedicados prioritariamente à atividade
revolucionária. Nele, os sindicatos são importantes espaços de conscientização
da classe operária através da luta econômica, mas a luta econômica deve estar
subordinada a luta política, e nesse sentido, a organização sindical deve estar
submetida à organização partidária, ou seja, o partido é o grande instrumento
da revolução.
Por maiores que fossem
as cisões e os métodos aplicados, havia uma coincidência quanto aos objetivos,
de acordo com Reis Filho (1980, p.119) “... os descontentes não se afastavam
por divergência de princípios, ao contrário, mas por considerarem, que os princípios
não estavam sendo devidamente observados”. Apesar de nuances em relação a
alguns pontos que diferenciavam uma organização de outra, os programas das
diferentes organizações tinham semelhanças ou aproximações, com o centralismo
democrático, tal como foi definido e implementado pela concepção leninista de
partido.
Esta tradição, não
raras vezes causou muito desconforto entre os militantes que não se sentiam
integrados totalmente na organização. Com isso, ganha força, entre alguns
operários militantes que não se enquadravam dentro das organizações, a noção do
“trabalhador autêntico”, que passou para o “militante autêntico” e finalmente o
“dirigente autêntico”. Essa noção de autenticidade aparece como uma forma de
demarcar aquele trabalhador comum que se engaja na luta, mas se autodefine como
independente, do “militante profissional” de determinada organização que se proletarizou
para fazer política.
No auge da luta contra
a ditadura militar, havia por parte de algumas organizações de esquerda uma super-valorização
de seu papel, e uma desvalorização dos militantes enquanto indivíduos, enquanto
seres críticos. Ao ingressarem nas organizações de esquerda, os militantes
tiveram que abdicar de sua individualidade no sentido mais amplo da expressão.
É como nos aponta Reis Filho (1980, p125) “O saber e o poder de cada militante
são dádivas do partido e da vida partidária. Por maiores que sejam suas
capacidades, o militante nunca deverá esquecer duas coisas: suas prerrogativas
e conhecimentos do Partido e, em segundo lugar, sua inserção no partido é que
tornou possível possuir o que possui.”
Margarida Maria
Alves
(1943-1983) – Trabalhadora rural e Presidente do Sindicato de Alagoa Grande
(PB). Em sua gestão de 12 anos, foram movidas mais de 600 ações trabalhistas
contra os usineiros e senhores de engenho da região. Foi assassinada por
pistoleiros, em 12 de agosto de 1983, diante do marido e dos dois filhos.
Nas páginas anteriores, observamos um
pouco da história do sindicalismo que antecedeu às grandes greves de massa de
1979 e 1980, e que representou um período de acúmulo de forças através de um
trabalho pulverizado, anônimo, quase silencioso, mas que foi fundamental para o
avanço das lutas e para construção de um sindicalismo combativo originário das
oposições sindicais e das novas direções que iam assumindo uma postura de apoio
e liderança das lutas que iam brotando nos locais de trabalho. Essas lutas como
já dissemos, permitiu o encontro de militantes das organizações de esquerda,
dos militantes independentes “autênticos”, de militantes católicos que formaram
a base do novo sindicalismo que com sua luta e seus princípios reescreveram as
páginas do sindicalismo brasileiro.
2 1ª\w/Debata
em grupo se ainda hoje há reflexos na CUT e nos Sindicatos das ações feitas
pela esquerda revolucionária e dos grupos ligados à Igreja Católica.
PARTE III
O Novo Sindicalismo e as
Greves que Mudaram a Cara do País
Afinal, por que novo sindicalismo? O que significava velho
sindicalismo? Cite algumas diferenças percebidas pelo grupo.
O chamado
novo sindicalismo se insurge e se autodefine a partir de duas experiências, uma
mais do presente e outra mais do passado: Primeiro contra as práticas de
acomodação, burocratização do sindicalismos “pelego” que transformaram os sindicatos
em máquinas de assistencialismo, como no caso paradigmático do Sindicato dos
Metalúrgicos de São Paulo. Lula em entrevista de 1978 expressa com clareza sua
posição contra a burocratização do sindicalista:
“O dirigente sindical que se preza não pode
em nenhum momento ver o sindicato como órgão empregatício que lhe dê um status.
O dirigente sindical que se preza não pode deixar de denunciar as
arbitrariedades existentes dentro de sua categoria. O pelego é a omissão do
movimento sindical brasileiro. É de muita recepção, mas de pouca. participação.
Um dirigente sindical que se preza não deveria se sujeitar a ser vogal, um juiz
classista, apenas para ganhar dinheiro.” (Lula: entrevista e discursos. São Paulo: s.e,
1981.p.28, apud Mattos, 1998, p.64)
As demandas
dos trabalhadores oriundas dos locais de trabalho não atravessavam a porta de
entrada do sindicato que, por sua vez, também não atravessava o portão da
fábrica. Eram dois mundos separados. Aos novos militantes eram vedados os
espaços de participação dentro do sindicato. As aposições não tinham liberdade
de expressão nas assembléias da sua categoria. Qualquer crítica a diretoria era
tida como conspiração e os seus autores, muitas vezes, eram reprimidos de forma
violenta. O novo sindicalismo localizado na sua maior parte no local de
trabalho coloca como uma das questões fundamentais na sua luta a democratização
dos sindicatos e o fim da intervenção do Estado na estrutura sindical através
da adoção da liberdade e autonomia sindical.
O segundo
aspecto em relação a experiência que o novo sindicalismo procura se contrapor
diz respeito a sua desvinculação com o passado sindical do período 1945-1964,
negação essa, que será também base de suporte para esse novos sujeitos se
auto-proclamarem representantes de um “novo sindicalismo”. Em documento da
década 1970 a oposição metalúrgica de São Paulo expressa sua visão em relação
ao passado recente.
“Historicamente, está começando a segunda
etapa do sindicalismo brasileiro. Não mais o sindicalismo dos tempos de Getúlio,
ou de Jango, baseado na confiança e na expectativa do governo. Hoje está
nascendo um sindicalismo novo, sem esperança do governo e sem meios-termos com
os patrões. Sindicalismo que vê claro o
centro do problema: o problema
político, problema da luta de classe... a lição fundamental é a seguinte:
sindicalismo novo, verdadeiro, tem que nascer de baixo para cima, da. fábrica
até a organização das várias fábricas em organização de classe: o sindicato”(citado
por Mattos, 1998,p.62).
Desta
forma, as ações do “novo sindicalismo” deveriam ser entendidas como uma ruptura
com as práticas do “velho sindicalismo”,dito populista, marcado pelo
“vanguardismo”, pelo “cupulismo”, pelo distanciamento das bases e pela
debilidade organizativa, características de um sindicalismo que se mostrou
frágil para resistir ao golpe de 1964 e incapaz de romper com a velha estrutura
sindical corporativa.
Dentro
dessa perspectiva de análise, o pecado capital desse velho sindicalismo teria
sido a estratégia de aliança com o populismo, inviabilizando a perspectiva de
construção de um projeto autônomo por parte da classe trabalhadora, fruto das
opções equivocadas da esquerda hegemonizada pelos comunistas, que subordinava a
política sindical (que não questionava a estrutura sindical oficial) à
estratégia do partido. Dessa forma o “sindicalismo populista” era visto como de
cúpula, sem organização de base, corporativista e atrelado ao Estado. Além
disso, Em contraposição o novo
sindicalismo que emergia no final dos anos setenta reivindicava um sindicalismo
de massa, de base, democrático livre e autônomo do Estado e dos partidos.
Essa visão
dicotômica e polarizada entre o passado e o presente, tem sofrido revisões
tanto por parte da academia, como por parte dos próprios dirigentes da CUT. A
própria dificuldade do sindicalismo cutista de romper com a estrutura sindical
(inclusive com o imposto sindical), e efetivar de forma mais abrangente a
organização sindical no local de trabalho tem levado os herdeiros do novo
sindicalismo a olhar com mais humildade para as experiências do passado e
reconhecer a importância do legado dos dirigentes que vivenciaram a experiência
no período anterior a 1964.
Dessa
forma, a CUT continua fiel aos seus princípios desde a sua origem na
perspectiva de construir um modelo alternativo à atual estrutura sindical
corporativista pautado nos princípios da liberdade e autonomia sindical, da
organização sindical no local de trabalho, da organização dos ramos de
atividade, do reconhecimento das centrais, do pluralismo e da democracia. A CUT
reconhece que a sua prática ao longo dos anos contribuiu para forjar uma nova
cultura sindical que a identificam como uma central classista e de luta. Mas ao
mesmo tempo, reconhece que essa conquista também é tributária do esforço de
antigas gerações que precederam o novo sindicalismo.
1979:
de Sul a Norte, inúmeras categorias profissionais fizeram valer, na prática, o
direito de greve.
O ano de
1979 inaugurou a retomada das grandes greves de massa na história do
sindicalismo brasileiro, cujo epicentro foram as greves dos metalúrgicos de São
Bernardo e Diadema de 78, 79 e 80. A ressonância desses acontecimentos marcou a
história política do país e imprimiu um novo curso no processo de abertura
política levada adiante pelos militares, e, sobretudo, impactou a história da
esquerda brasileira nestes últimos 25 anos.
O ano de 1979 é decisivo para
a consolidação do novo sindicalismo e de um novo projeto de sociedade no
Brasil. Os sinais de uma confrontação maior com o patronato também já se
desenhavam no processo de encaminhamento das reivindicações dos trabalhadores.
Um desses sinais pode ser observado nas orientações do Sindicato das Indústrias
Metalúrgicas do Estado de São Paulo (SIMESP), cuja recomendação aos associados
era de que, “para enfrentar eventuais greves, deviam estocar a produção”.
Atento aos lances patronais, o sindicato dos trabalhadores conclamava suas
bases para que ninguém fizesse hora-extra e nem se esforçasse para aumentar a
produção (Bargas e Rainho. 1983:118).
A campanha salarial dos
Metalúrgicos do ABC de 1979 foi coordenada pela Federação dos Metalúrgicos do
Estado de São Paulo e reuniu 34 sindicatos de todo o estado. Em reunião
realizada no dia 31 de janeiro, foi deliberado o encaminhamento de uma pauta única,
com 22 itens, que deveria ser submetida, por meio da realização de assembléias
da categoria, à aprovação das bases de cada sindicato signatário das
reivindicações. No caso dos metalúrgicos de São Bernardo, a direção do
sindicato, prevendo uma batalha mais árdua, organizou inúmeras assembléias,
intensificou o trabalho organizativo nas fábricas, e criou também, por meio de
eleição direta, uma comissão de salários, com o objetivo de ajudar a direção na
condução do movimento, no caso de uma greve geral da categoria (Antunes.
1988:44). Depois de três rodadas de negociações públicas, e, algumas secretas,
os patrões se mostraram inflexíveis, apostando na divisão do movimento. Na
assembléia do dia 12 de março, os trabalhadores decretaram a greve diante da
negativa dos empresários, reafirmando a posição tirada em assembléias
anteriores[3].
O movimento
passou a contar no seu cotidiano, com grandes assembléias de massa, envolvendo
60, 70 e até 110 mil pessoas, que se reuniam no Estádio Costa e Silva que, a
partir dessa greve, passou a ser conhecido como Estádio de Vila Euclides.
A ocorrência de piquetes, que procurava alcançar milhares de
trabalhadores, também passou a fazer parte das imagens da greve. E quando a
repressão se intensificou nas portas das fábricas, os piquetes se deslocaram
para os bairros, mais precisamente nos pontos de ônibus, onde, longe dos olhos
da polícia, havia mais tempo para dialogar e tentar convencer os trabalhadores
indecisos a aderirem à greve.
Já no
segundo dia de paralisação, a greve foi considerada ilegal. Em relação ao
reajuste, o Tribunal Regional do Trabalho propôs um índice de 44% a partir de
1º de abril de 1979, bem abaixo dos 65% proposto pelos representantes dos
trabalhadores em reunião de conciliação.
Dando
continuidade à tática de pressão sobre as lideranças do movimento, o Ministério
do Trabalho abriu sindicância para apurar denúncias de infiltração de pessoas
estranhas ao movimento com objetivo de desgastar o governo[4]. No domingo, dia 18, foi realizada uma
assembléia com 80 mil trabalhadores acompanhados por mulheres e filhos. As
lideranças se sentiram aliviadas diante do estrondoso sucesso da assembléia,
pois havia muita insegurança sobre como os trabalhadores se comportariam no
primeiro final de semana da greve, mas, ao invés da dispersão, os metalúrgicos
saíram ainda mais mobilizados para enfrentar a semana seguinte.
Diante da
perspectiva de descontrole do movimento por parte das lideranças, Lula é
pressionado por outras diversas lideranças sindicais, que se solidarizavam com
os metalúrgicos, e pelo comando de greve a reassumir a direção do movimento. Na
manhã do dia 25 de março, após a missa que reuniu cerca de 20 mil trabalhadores
na igreja matriz de São Bernardo, Lula e Benedito Marcílio reassumiram a
direção da greve em São Bernardo e Santo André, respectivamente.
Depois de
diversas reuniões, uma proposta de trégua foi apresentada pelos empresários e
aceita pelos representantes dos trabalhadores. No dia seguinte, 15º dia de
greve,
Lula, em
assembléia da categoria, defendeu a proposta de trégua de 45 dias e retorno
imediato ao trabalho. Apesar de algumas manifestações contrárias, a proposta
foi aprovada pela maioria[5].
As
comemorações do Primeiro de Maio, em São Bernardo do Campo, reunindo 130 mil
pessoas, incluindo personalidades artísticas, e lideranças sindicais de várias
regiões do Brasil, além de políticos e intelectuais que se solidarizaram com a
luta dos trabalhadores do ABC, foram fundamentais para mudar os rumos dos
acontecimentos, quebrando a intransigência patronal e fortalecendo
politicamente os metalúrgicos do ABC, que se transformaram em referência na
luta contra a Ditadura Militar. Às vésperas de expirar o prazo final da trégua,
os representantes da FIESP e dos metalúrgicos do ABC celebraram um acordo que,
depois de aprovado em assembléia, no dia seguinte, encerraria a campanha
salarial de 1979.
De Sul a Norte,
o direito de greve é conquistado na luta
Em Porto Alegre, no dia 5 de setembro de 1979, 10
mil bancários e bancárias deflagravam uma greve que mudou a história do
sindicalismo no Rio Grande do Sul.
Seguindo o caminho dos metalúrgicos do ABC, os trabalhadores e
trabalhadoras das agências bancárias de Porto Alegre paralisaram os serviços
por 14 dias, manifestando-se em defesa de suas reivindicações e contra a
ditadura militar, ampliando assim a luta do conjunto dos trabalhadores por
liberdade, justiça e direitos.
Essa greve, como as demais,
contou com a solidariedade de outras categorias de diversas cidades do Brasil. Lula se solidarizou com bancários, foi o
orador mais aplaudido em assembléia que contou com a presença de 3.000
bancários ao fim da primeira semana de paralisação, mas foi impedido de visitar
o líder dos bancários, Olívio Dutra, que se encontrava preso pelos
órgãos da ditadura.
Em outubro
do mesmo ano, aconteceu a greve dos metalúrgicos de São Paulo, comandada, na
prática, pela oposição sindical. Quando a greve estava em franco declínio,
acorreu o assassinato de Santo Dias da Silva, atingido por um tiro desferido
por um policial, defronte a uma fábrica na Zona Sul da capital paulista. Esse
episódio incendiou a greve, e o sepultamento de Santos Dias transformou-se em
uma grande manifestação popular contra a ditadura. Também foi um momento
importante de aproximação entre a oposição metalúrgica de São Paulo e com as
lideranças sindicais de São Bernardo[6].
Sindicais,
EME fevereiro de 1980 no Encontro de João Monlevade, Minas Gerais, cujo
objetivo era mudar as formas de atuação sindical, fortalecendo os sindicatos e
buscando a adesão de outros setores atuantes no campo e na cidade.
Na
resolução final, os participantes do encontro se propunham a tarefa de realizar
encontros como aquele em todas as regiões a fim de articular o movimento
popular engajado na luta pela “libertação
integral do povo brasileiro”
A reação dos militares e a resposta do novo sindicalismo
Após a
grande onda de greves que atingiu inúmeras categorias em todas as regiões do
país no ano de 1979, o governo militar tomou medidas para amortecer o ímpeto
mobilizador e reivindicatório dos trabalhadores. Decretou uma nova política
salarial que estabelecia o reajuste semestral dos salários e a adoção do Índice
Nacional de Preços ao Consumidor (INPC), fixado pelo governo, com reajustes
maiores para as camadas salariais menores. Com essa política, a negociação
salarial direta entre trabalhadores e empregadores acima do INPC, aumento real
de salário ou recomposição de perdas, ficava restrita a um determinado índice
associado à produtividade.
Do lado dos
trabalhadores, com o aprendizado das greves do ano anterior, as campanhas
salariais do ano de 1980 foram cuidadosamente preparadas pelos sindicatos,
particularmente pelo sindicato dos metalúrgicos de São Bernardo, que contava
com a possibilidade iminente de uma nova greve ainda mais difícil que a
anterior.
Por isso,
um intenso trabalho de mobilização nas fábricas e nos bairros foi posto em
prática. Ao longo do segundo semestre de 1979 até março do ano seguinte,
prevendo-se um conflito mais prolongado, e foi exatamente o que aconteceu[7].
Aproximadamente
60 mil trabalhadores, em assembléia no dia 30 de março, votaram pelo início da
greve a partir de 1º de abril[8].
Começava mais uma batalha, desta vez de 41 dias, cujo impacto marcou
profundamente a história do sindicalismo brasileiro e mudou os rumos da
redemocratização, conferindo-lhe um caráter mais amplo do que pareciam prever,
inicialmente, os militares.
A adesão à
greve foi esmagadora, atingindo 90% dos 142 mil metalúrgicos em São Bernardo,
sem que houvesse necessidade de se lançar mão da ação dos piquetes, como
ocorrera no ano anterior, e com a importante adesão dos metalúrgicos de Santo
André e São Caetano, os sindicatos de Campinas, Sorocaba, Taubaté, Santa
Bárbara e Jundiaí.
Seguindo a
orientação do sindicato, a proposta do TRT foi recusada em assembléia que
reuniu mais de 100 mil trabalhadores no Estádio de Vila Euclides, que mesmo
enaltecendo o fato de a greve não ter sido considerada ilegal como uma vitória
dos trabalhadores, avaliava que a proposta feita pelo TRT não alterava em
praticamente nada a proposta patronal recusada anteriormente. Num certo
sentido, até a piorava, pois tirava Cr$ 800,00 do piso salarial, o que
representava 10% dos salários menores.
A greve
seguia sua dinâmica natural, com suas gigantescas assembléias de milhares de
trabalhadores, reuniões por fábrica no sindicato, assembléia nos bairros,
produção de material informativo, e arrecadação de alimentos e dinheiro por
parte do Fundo de Greve, que passou
a receber doações de entidades sindicais e de movimentos sociais de todo o
país.
Com a solidariedade que vinha de trabalhadores e trabalhadoras de
todo país, a direção do sindicato e os grevistas encontraram mais força para
resistir às ações repressivas do governo, tanto pela declaração de ilegalidade
por parte do TRT quanto pela força policial deslocada para a região do ABC, e
das empresas, que sinalizavam com a disposição de intensificar as demissões e
outras medidas disciplinares contra os trabalhadores.
Desse modo, mesmo com a intervenção no
sindicato, a prisão de Lula e de vários dirigentes sindicais a greve não
terminou. Além da direção que tinha Lula
à frente, havia um comando de greve composto de dezesseis membros que
substituiria a direção no momento em que ela fosse impedida de exercer suas funções.
Havia ainda um escalão intermediário, formado por 45 trabalhadores, que se
encarregava de transmitir as orientações à comissão de salário e à comissão de
mobilização, compostas de 446 membros, que, distribuídos nas fábricas e nos
bairros, faziam a ponte entre os grevistas e o comando da greve.
Essa
estrutura organizativa conseguiu conduzir a greve apesar das dificuldades,
reafirmando nas assembléias a disposição de continuar até a vitória, o que
incluía a libertação dos líderes sindicais e o fim da intervenção sindical.
O 1º de maio de 1980, dia de luta e solidariedade
Naquele
ano, em São Bernardo, o Dia do Trabalho foi comemorado por mais de 100 mil
pessoas e se converteu numa das mais vigorosas manifestações da sociedade civil
contra a ditadura militar e em apoio aos metalúrgicos diante das ameaças de
demissão por justa causa e do terrorismo veiculado pelos meios de comunicação.
Conforme descreveu Eder Sader:
Era a manhã ensolarada
do dia 1º de maio de 1980, e as pessoas que haviam chegado ao centro de São
Bernardo para a comemoração da data se depararam com a cidade ocupada por oito
mil policiais armados, com ordens de impedir qualquer concentração. Já desde as
primeiras horas daquele dia as vias de acesso estavam bloqueadas por comandos
policiais que vistoriavam ônibus, caminhões e automóveis que se dirigiam à
cidade metalúrgica. Pela manhã, enquanto um helicóptero sobrevoava os locais
previstos para as manifestações, carros de assalto e brucutus exibiam a
disposição repressiva das forças da ordem. É que aquele Dia do Trabalhador
ocorria quando uma greve dos metalúrgicos da região alcançava já um mês de
duração e levara o chefe do Serviço Nacional de Informações a prometer que
“dobraria” a “república de São Bernardo”. O que poderia ter permanecido um
dissídio salarial tornara-se um enfrentamento político que polarizava a
sociedade[...] Alguns minutos depois das 9 horas, o bispo d. Cláudio Hummes
iniciava a missa para 3 mil pessoas que lotavam a igreja da Matriz, num clima
de tensão, sem saber o que se passaria em seguida, quando da programada
passeata proibida (Sader, 1988:27-28).
Essa passeata, depois de
momentos de tensão e de tentativas de negociação por parte de alguns
parlamentares presentes, como o senador Teotônio Vilela, foi autorizada pelo
governo federal. Logo que a notícia se espalhou, começou a se formar um imenso
corredor de pessoas caminhando pelas ruas centrais de São Bernardo em direção
ao Estádio da Vila Euclides, que foi reconquistado ao som da canção “Para
não dizer que não falei das flores” de Geraldo Vandré, cantada por cerca de
120 mil pessoas, entre mulheres, crianças, estudantes, intelectuais, artistas,
parlamentares, lideranças populares e líderes religiosos.
“O que acontecera na manhã de 1º de
maio de 1980 parecia condensar a história de todo o movimento social que
naquele dia mostrava a cara ao sol” (Sader, 1988: 29).
Sem dúvida alguma, as
manifestações de solidariedade no 1º de maio deram uma nova injeção de ânimo
aos grevistas, mas os impasses da greve permaneciam os mesmos e as perspectivas
de um desfecho vitorioso pareciam cada vez mais difíceis.
O ressurgimento do
movimento sindical na cena política brasileira, a partir de 1978, significou
não só a resistência à superexploração a que estava submetida a classe operária, mas principalmente
o resgate de sua dignidade. “A luta dos trabalhadores deu-se basicamente como
expressão de uma luta mais ampla por direitos de cidadania no interior da
sociedade” (Rodrigues. 1997:19). A classe trabalhadora que se afirmou naquele
cenário de lutas já não aceitava mais a noção de uma cidadania limitada. Por
isso, o movimento sindical emergente procurava se articular nacionalmente, na
perspectiva de construir novas referências a partir da experiência
operária-sindical que ganhara ruas e praças em plena ditadura militar.
PARTE IV
As articulações
sindicais e a fundação da CUT
Mesmo que não tenha conseguido
silenciar por completo a resistência operária, a ação repressiva que sucedeu as greves
de 1968 desarticulou o movimento sindical combativo por quase uma década. Chama
a atenção, no entanto, como o movimento sindical se reorganizou de forma
surpreendentemente rápida. Para Rodrigues
(1991:13-14), três fatores concorreram para isso:
1)
a permanência da estrutura sindical de forma intacta durante
o regime militar, o que permitiu à nova geração de dirigentes, razoáveis
recursos administrativos e financeiros quando estiveram à frente dos
sindicatos;
2)
a ascensão de dirigentes desvinculados da herança janguista
e do antigo PTB e pouco influenciados pelo PCB, ou seja, sem ligações com o
esquema comunista-petebista anterior a 1964 e com organizações de esquerda que
surgiram após o golpe militar de 1964, permitiu que a penetração desses
dirigentes na estrutura oficial se desse de forma quase imperceptível pelos
órgãos controladores do Ministério do Trabalho;
3)
a mudança na postura da Igreja Católica, na sua vertente
“progressista”, com relação aos movimentos populares e também ao sindicalismo,
o que resultou
na aproximação de lideranças dos movimentos populares com o chamado
“sindicalismo autêntico”.
Entre as primeiras iniciativas intersindicais,
articulações entre diferentes categorias, e a fundação da CUT, em agosto de
1983, se passaram pouco mais de cinco anos, um tempo relativamente curto se
levarmos em conta o ambiente repressivo da época.
Já em novembro de 1977,
um grupo de 205 sindicalistas de São Paulo foi à Brasília e, em audiência com o
presidente Geisel, reivindicou o direito de os trabalhadores realizarem o seu
Congresso Nacional das Classes Trabalhadoras (Conclat). A resposta do
Ministério do Trabalho foi positiva, desde que o referido encontro não se
convertesse em organismo intersindical permanente e fosse convocado pelas
confederações sindicais. A organização do congresso, contudo, não foi
encaminhada em função do boicote das confederações oficiais, mas sinalizou para
uma postura mais independente e autônoma de um grupo de dirigentes sindicais. (Véras Oliveira:2002 a: 111).
No ano seguinte, no mês
de julho, realizou-se, no Rio de Janeiro, o V Congresso da Confederação
Nacional dos Trabalhadores na Indústria (CNTI), em que o grupo de dirigentes
sindicais denominados “autênticos” defendia uma postura mais atuante e
combativa por parte das entidades sindicais, opondo-se à direção da CNTI,
comandada por Ari Campista.
Ao final do congresso,
os “autênticos” divulgaram uma Carta de Princípios que defendia a
redemocratização do país, o fim das leis de exceção, a convocação de uma
Assembléia Nacional Constituinte, e no plano sindical, pleiteava o direito de
greve sem restrições, a livre negociação com os empregadores e o
estabelecimento do contrato coletivo de trabalho[9].
Em outubro do mesmo ano,
os metalúrgicos de São Bernardo do Campo realizaram seu III Congresso, em cujas
resoluções aparece claramente a necessidade de os trabalhadores brasileiros
organizarem sua “central de trabalhadores” (Gianotti e Neto: 1990:29).
.
Em Lins, cidade do
interior de São Paulo, ocorreu, de 22 a 26 de janeiro de 1979, o IX Congresso
dos Trabalhadores nas Indústrias Metalúrgicas e de Material Elétrico do Estado
de São Paulo. O fato marcante desse evento foi o aparecimento, pela primeira
vez num encontro intersindical, da proposta da criação de um Partido dos
Trabalhadores. Essa proposta foi exposta de forma mais incisiva na comemoração
do 1º de maio daquele ano, em São Bernardo.
As oposições sindicais
que também começaram a se articular nacionalmente e realizaram, em 10 e 11 de
maio de 1980, o Encontro Nacional das Oposições Sindicais (ENOS), que reuniu
trabalhadores do campo e da cidade com o objetivo explícito de discutir a
unificação das lutas, trocar experiências, estabelecer um plano comum de lutas
e promover um debate nacional sobre a organização sindical,
além de contribuir para criação de uma central de trabalhadores. Compareceram
ao encontro bancários, jornalistas, metalúrgicos, professores, trabalhadores da
construção civil, e trabalhadores rurais ”(Gianotti e Neto: 1990:30-31).
.
Em 1980, ocorreram dois
encontros importantes do bloco combativo do movimento sindical, a ANAMPOS, Articulação
Nacional do Movimento Sindical e Popular. Esses encontros reuniram, além de
sindicalistas, líderes de pastorais operárias, de movimentos populares, de
atividades comunitárias de base e das oposições sindicais[10]. O encontro realizado
em João Monlevade, Estado de Minas Gerais, no Sindicato dos Metalúrgicos
daquela cidade, estabeleceu alguns princípios que seriam fundamentais para a
fundação CUT, tais como:
-a substituição da CLT
por um código de trabalho
-
a adoção do contrato coletivo de trabalho, liberdade e
autonomia sindicais de acordo com a Convenção 87 da Organização Internacional
do Trabalho (OIT)
-
fim da legislação restritiva ao direito de greve.
Em julho foi realizado o
Encontro de São Bernardo, que apontou um conjunto de reivindicações mais amplo
e mais radical, incluindo a luta pela posse da terra pelos trabalhadores rurais
e urbanos. Além da reivindicação de uma nova estrutura sindical, baseada nos
princípios da Convenção 87 da OIT, os participantes manifestaram-se a favor da
criação de uma central única dos trabalhadores e de organismos intersindicais
reunindo trabalhadores urbanos e rurais. Pela primeira vez, apontou-se de forma
clara a necessidade de um partido político capaz de contribuir para a libertação
das classes populares (Rodrigues: 1991:20).
O ano de 1980,
impulsionado pelas lutas sindicais, continuou bastante movimentado em relação
às articulações sindicais. Nos dias 13 e 14 de setembro realizou-se o I
Encontro Nacional de Trabalhadores em Oposição à Estrutura Sindical (ENTOES),
cujo objetivo, era estreitar os laços e estabelecer uma aliança entre as
oposições sindicais combativas e os sindicalistas autênticos. Porém, os
sindicalistas presentes ao encontro se opuseram à proposta de criação de uma
organização própria que excluísse parte dos sindicalistas da “Unidade Sindical”
e defenderam a participação de todos na I Conferência Nacional da Classe
Trabalhadora.
O lançamento oficial do
PT, que ocorreu em 10 de fevereiro de 1980, no tradicional Colégio Sion, em São
Paulo, acentuou as divergências já existentes no interior do sindicalismo
brasileiro. O caso mais evidente se deu com as correntes sindicais vinculadas
aos partidos comunistas, que obviamente não viam com simpatia o fato de setores
emergentes do sindicalismo apostarem seu futuro político numa nova agremiação
sindical. Desse modo, segundo Leôncio Martins Rodrigues (1991: 27-28), é
possível distinguir quatro grandes tendências às vésperas da realização da
CONCLAT, a primeira grande conferência nacional da classe trabalhadora após
1964:
1.
Unidade Sindical que reunia sindicalistas sob a
influência do PCB, do PC do B e do MR-8. Recomendavam prudência e moderação nas
mobilizações operárias para não colocar em risco a abertura democrática, neste
sentido, eram contrários à idéia de uma greve geral, e rejeitavam a convenção
87 da OIT como referência para adoção da liberdade e autonomia sindical.
2.
Bloco dos sindicalistas independentes ou autênticos: que tinha Lula como
principal liderança referência era o combate à legislação sindical, luta contra
a política salarial, pelo direito de greve, pela liberdade e autonomia sindical
e pela negociação direta entre sindicato e empresa.
3.
As oposições sindicais, que formavam um grupo
relativamente heterogêneo de ativistas sindicais (conforme já falamos) e tinham
com principais bandeiras a organização no local de trabalho por meio de
comissões de fábrica, a oposição à estrutura sindical e a defesa da liberdade e
autonomia sindicais, de um modo geral rejeitavam a aliança com os pelegos e com
os “reformistas” da Unidade Sindical e procuravam formar um bloco com os
“autênticos”. Grande parte das oposições
tinha origem na militância da Igreja Católica, mas havia membros da esquerda
como ativistas do PC do B na oposição metalúrgica de São Paulo, que não vão
aderir à CUT nos seus primeiros anos.
4.
E, finalmente, o quarto bloco, formado por ativistas de
extrema esquerda, vinculados a pequenos agrupamentos de esquerda que viam
na ação sindical uma perspectiva revolucionária que, de alguma forma, levaria à
exacerbação dos conflitos de classe, rumo ao socialismo; na sua maioria, viam
como opção tática a aproximação com os sindicalistas combativos.
O III Encontro, em junho
de 1981, aconteceu em Vitória, Espírito Santo, e reuniu 130 delegados de 18
estados. Assim como nos encontros anteriores, foram aprovadas propostas que
iam, passo a passo definindo e estruturando a concepção do sindicalismo
combativo, sempre numa estratégia paralela com os movimentos populares. Dentre
elas:
-a reforma agrária sob
controle dos trabalhadores;
-a decretação de uma
greve geral que envolvesse não apenas os sindicatos, mas também as associações
e movimentos do campo e da cidade;
-o fim da estrutura
sindical e a formação de uma central única dos trabalhadores
(Rodrigues.1991:21).
Nesse encontro, ficou
mais demarcada a linha divisória entre as diversas correntes do movimento
sindical, ao se mostrarem infrutíferas as tentativas de atrair para a ANAMPOS
os sindicalistas “reformistas”, como Arnaldo Gonçalves, presidente do Sindicato
dos Metalúrgicos de Santos e dirigente do Partido Comunista Brasileiro, numa
evidente estratégia cujo intuito era afastá-los da aliança com os pelegos, o
que se mostrou inviável em pouco tempo. Por outro lado, “os sindicalistas
autênticos se aproximavam cada vez mais das oposições sindicais, afastando-se
de companheiros de viagem que tinham práticas cada vez mais discordantes”.
(Gianotti e Neto: 1990:35).
Apesar dos
sinais visíveis de desgaste entre as diversas correntes do sindicalismo
brasileiro, foi realizada, entre 21 e 23 de agosto de 1981, na Praia Grande,
litoral de São Paulo, a I Conferência Nacional das Classes Trabalhadoras
(CONCLAT), reunindo 5.427 trabalhadores do campo e da cidade, representando
todas as frações do movimento sindical brasileiro. Desde o golpe de 64, era a
primeira vez que isso acontecia, fato que causou grande impacto no cenário
político nacional. Além disso, em 1981, os trabalhadores passaram a
experimentar os efeitos da crise econômica que o país começava a viver de forma
mais aguda, graças principalmente ao agravamento do endividamento externo, cujo
primeiro impacto se manifestou nas demissões em massa e no conseqüente
desemprego[11],
provocados pelo ajuste recessivo na política econômica, levado a cabo pelo
governo do general
Figueiredo (Mattoso. 1995:139).
Esse
cenário, visivelmente desfavorável às grandes mobilizações de massa, como as de
1979 e 1980, colocava, a necessidade cada vez mais urgente de uma organização
intersindical dos trabalhadores no plano nacional.
A
realização dessa Conferência atestou a grande capacidade de rearticulação do
movimento sindical, porém, expos a profunda divisão do sindicalismo brasileiro,
em dois grandes blocos, e as divergências em torno da criação de uma central
única, embora ambos os lados fizessem questão de reafirmar seu compromisso com
a unidade no campo sindical.
Porém, de
um lado, os “autênticos” e as oposições sindicais, defendiam a realização de
uma greve geral como resposta à crise econômica e ao desemprego, além das
mencionadas propostas de desmontagem da estrutura sindical por meio da
implantação da liberdade e autonomia sindicais. De outro, o bloco da reforma ou
da unidade sindical, que via na greve geral uma provocação aos militares e
ameaça ao processo de abertura. Para esse bloco, a alternativa para os
trabalhadores passava por um “Pacto Social” construído com as elites, como
processo de transição para a democratização do país.
Tais
divergências, apesar de não permitirem o avanço no que se referia a aspectos
mais específicos da organização sindical, não impediram que fosse votada e
aprovada uma ampla plataforma de luta e mobilização, juntamente com
reivindicações que traduziam aspectos de consenso geral, como a defesa da
democracia, a convocação de uma Assembléia Nacional Constituinte, a liberdade
de expressão, o desmantelamento dos organismos de repressão, o direito de
greve, a estabilidade no emprego, e a reforma agrária, entre outros.
Ao final da
conferência, foi eleita a Comissão Nacional Pró-CUT, formada por 56
sindicalistas urbanos e rurais de todas as tendências, com objetivo de
preservar a unificação do movimento sindical e preparar a criação da Central
Única dos Trabalhadores, prevista para agosto de 1982.
As
divergências preponderaram sobre os consensos na Comissão Pró-CUT, o que acabou
inviabilizando a realização do congresso de fundação da central na data
prevista, no ano de 1982. Argumentavam os membros da Unidade Sindical que não
havia condições para a preparação, naquele ano, de um grande encontro nacional.
Além disso, argumentavam que 1982, um ano de importantes eleições, não seria
propício para a realização
do CONCLAT (Rodrigues, 1991:33).
No entanto,
o ponto central da discórdia entre os dois grupos dizia respeito aos critérios
de representação e eleição dos delegados ao congresso. Os “autênticos” e seus
aliados eram favoráveis a uma central sindical com caráter mais amplo, que
incorporasse as “oposições sindicais”, o que era garantido pelo artigo 8º do
regimento interno do futuro congresso, e que, ao mesmo tempo, reduzisse o papel
das federações e confederações. O presidente da Confederação dos Trabalhadores
da Agricultura, José Francisco da Silva, alinhado com o bloco da Unidade
Sindical, assim se expressou:

Foram inúmeras reuniões
ao longo de 1982 e 1983 com o objetivo de negociar as diferenças e estabelecer
um compromisso no sentido de manter o movimento sindical unido até a realização
do congresso, inclusive com encontros estaduais (Enclats) para a escolha de
delegados[13]. Porém, quando José
Francisco deu esta declaração ao jornal Voz da Unidade, já estava
esgotada a última tentativa de conciliação entre as duas correntes que
polarizavam o sindicalismo brasileiro, ocorrida em reunião no dia 7 de agosto,
quinze dias
antes do I Congresso da Classe Trabalhadora (CONCLAT).
“Depois de uma longa viagem
de mais de três mil quilômetros, no dia 23 de agosto, a delegação integrada por
45 trabalhadores rurais de Santarém (Pará) seria a primeira a chegar a São
Bernardo do Campo para participar do I CONCLAT, que teria início três dias
depois”.[14]
PARTE V
A fundação da CUT
E assim
foram se unindo aos trabalhadores do Pará, no dia seguinte àqueles 23 de
agosto, outras delegações que chegavam de todo o país, superando a expectativa
dos organizadores, que esperavam algo em torno de quatro mil participantes. As
atividades culturais começaram no dia 25, quinta-feira, com a encenação, pelo
Grupo de Teatro Forja, formado na sua maioria por trabalhadores metalúrgicos,
da peça “Operário em construção”. No dia seguinte, como previsto,
ocorreu a abertura oficial do histórico I Congresso da Classe Trabalhadora
(CONCLAT), nas também históricas dependências dos estúdios da Cia de Cinema
Vera Cruz. Mesmo sem a participação dos sindicalistas da Unidade Sindical, o
congresso que fundou a CUT teve a participação de 5.059 delegados de 912
entidades, representando 12.192.849 trabalhadores[15].
Num
contexto de crise econômica, com arrocho salarial e desemprego elevado, além de
vários sindicatos sob intervenção, o Plano de Lutas do congresso se orientou
para dar uma resposta política mais radical àquela conjuntura, por exemplo:
-
o fim da política econômica do
governo
-
o rompimento com o FMI
-
a liberdade e a autonomia
sindical
-
a liberdade de organização política
-
a reforma agrária radical sob
controle dos trabalhadores
-
a suspensão do pagamento da
dívida externa
-
o direito irrestrito de greve
-
as eleições diretas para
presidente, prefeitos das capitais e das áreas de segurança nacional
-
o fim das intervenções
sindicais e a reintegração das diretorias cassadas
-
o reconhecimento da CUT como
órgão máximo de representação dos trabalhadores
Após a aprovação do plano de lutas seguiu-se o momento mais esperado
da pauta do congresso: a criação da CUT. Após a discussão e aprovação do texto
preliminar nos grupos, foi elaborada uma redação final com pequenos ajustes em
relação ao texto original:
“A plenária
de delegados dos trabalhadores (eleitos para o I CONCLAT) aprovou em 26 de
agosto de 1983, a criação da Central Única dos Trabalhadores, que passará a
constituir-se como direção capaz de encaminhar, de forma organizada, a nível
nacional, as lutas comuns dos trabalhadores.
Esse
organismo deve ser representativo, democrático e independente do Estado, dos
patrões e dos partidos políticos, com seus estatutos aprovados neste congresso.
Sua
primeira diretoria será eleita neste CONCLAT, com mandato de um ano, tendo a
incumbência básica de, no plano político, encaminhar o plano de lutas aprovado
e, no âmbito organizativo, estruturar e implantar a CUT em todos os níveis
”(Op.cit., p.164).
A Central
reafirma seu princípio fundamental que orientou o novo sindicalismo desde as
suas primeiras manifestações:
“A CUT
luta pela mudança da estrutura sindical brasileira, corporativista, com o
objetivo de conquistar a liberdade e a autonomia sindicais. A CUT luta pela
transformação dos atuais sindicatos em entidades classistas e combativas,
organizados a partir de seus locais de trabalho. A CUT luta para construir
novas estruturas e mecanismos capazes de possibilitar e garantir conquistas que
sejam do interesse da classe trabalhadora. O sindicato pelo qual a CUT luta
será organizado por ramo de atividade produtiva, será democrático e de massas”(Op.cit.
p.178)

Com a
fundação da CUT, o movimento sindical escrevia um dos capítulos mais
importantes de sua história. Um capítulo com páginas generosas de lutas e
conquistas, porém, não isentas de contradições e ambigüidades, dentre elas, a
principal: a tentativa de romper com a estrutura sindical oficial a partir de
suas próprias bases, ou como se diz no jargão sindical, “a partir de dentro da
própria estrutura”.
A
iniciativa ousada dos chamados “combativos” mostrou-se acertada e representou
uma importante vitória para essa corrente que se lançou na dianteira, a fim de
ocupar o espaço político de representação nacional dos trabalhadores, criando
sua própria central sindical, conforme se pode atestar mediante seu
extraordinário crescimento ao longo dos anos 80, quando consolida sua hegemonia
no movimento sindical, comandando as principais mobilizações sindicais e
tornando-se a principal referência dos trabalhadores na defesa de seus
interesses[16].
Entre o apogeu e a crise: os
impasses do projeto sindical da CUT
Mesmo
com o desfecho conservador da transição democrática, com a derrota do movimento
pelas “diretas já”, o clima era de combate às ações grevistas lideradas pela
CUT (sempre invocado em nome do “pacto social”), o que não deixou de ser maior
liberdade de ação ao movimento sindical[17].
No
final da mesma década, era inquestionável a hegemonia da CUT como principal
expressão do sindicalismo brasileiro e, conseqüentemente, sua importância no
cenário político brasileiro[18]. As conquistas e os avanços do sindicalismo CUT eram inegáveis. As
greves constituíram segundo Noronha. (1994) apud Oliveira (2002:226) “o indicador do grau de expansão dos
sindicatos e de sua capacidade de mobilização. Aos poucos, tornaram-se o
instrumento de transformação das relações de trabalho. E, por fim, elevaram os
sindicatos ao status de interlocutores do
governo”.
Nesse
mesmo período, entretanto, os dirigentes cutistas começavam a reconhecer
limitações na prática sindical da Central, diante dos novos desafios postos
para o sindicalismo brasileiro. A frágil organização nos locais de trabalho foi
apontada como a principal debilidade dos sindicatos cutistas. A ação pautada no
carro de som e no boletim sindical distribuído na “base” mostrou-se
insuficiente para enfrentar o ritmo das mudanças no mundo do trabalho que
ocorreriam na década seguinte.
Os
anos 90 foram marcados pela perda de dinamismo do movimento sindical provocado
pelo impacto do projeto de inserção do país na economia globalizada, através da
política de abertura da economia brasileira, iniciada pelo Presidente Fernando
Collor de Mello e levada adiante pelo governo de Fernando Henrique Cardoso, que
desencadeou uma série de mudanças no comportamento das indústrias brasileiras e
da economia em geral, com repercussões diretas na vida dos trabalhadores[19].
Além
do aumento exponencial do desemprego, esse processo de “modernização” do país
incorreu num acelerado ritmo de informalização e precarização do mercado de
trabalho interrompendo uma trajetória histórica de formalização, ainda que em
bases de baixa qualificação e remuneração da mão-de-obra (Dedecca: 2005).
Essa
precarização do trabalho seguia a tendência de flexibilização e
desregulamentação das relações de trabalho que também caminhavam na
contracorrente do período anterior marcado pela conquistas de uma série de
direitos sociais e trabalhistas que foram incorporados pela Constituinte de
1988, fruto das mobilizações sociais daquela conjuntura.
Efetivamente
após o Plano Real (1994), as diversas medidas, apesar de seu caráter pontual,
contribuíram para alterar a forma de contratação e a determinação do uso do
tempo e da remuneração do trabalho no Brasil (Krein: 2003: 280-283). Para
completar esse panorama pouco animador para o sindicalismo, o governo FHC
decidiu por uma postura inflexível e intransigente em relação às greves, o que
pode ser atestado na reação enérgica do governo contra a greve nacional dos
petroleiros em maio de 1995, que paralisou dez refinarias em vários pontos do
país.

O
padrão de comportamento das chefias também começou a mudar. Nas grandes empresas, em especial,
foram adotadas estratégias de cooptação do trabalhador como cursos
comportamentais, prêmios por desempenho e dedicação ao trabalho.
A tarefa sindical dos anos 90 tornou-se mais
complexa e o processo de “modernização das empresas” ocorreu, na quase
totalidade dos casos, de maneira unilateral sem nenhum envolvimento dos sindicatos
no processo de negociação da reestruturação produtiva. Com esse volume de
mutações no cenário macroeconômico e na nova institucionalidade das relações de
trabalho, o sindicalismo brasileiro e, em especial a CUT, conhecera o primeiro
momento de crise estrutural, a exemplo do que acontecera cerca de uma década
antes no sindicalismo dos países centrais (como Estados Unidos e países
Europeus).
Temperada com as peculiaridades do contexto
nacional, a crise da CUT manifestou-se na limitação drástica do espaço de
intervenção sindical, dado pela ausência de mecanismos claros de proteção
salarial. Ficou reduzido pelo profundo impacto que o desemprego e a crise
exerceram – e ainda exercem - sobre a estrutura produtiva e sobre os próprios
postos de trabalho.
Assim a intervenção sindical foi aprisionada pelo
estreitamento da agenda sindical que passou a girar em torno de temas como
Participação nos Lucros e Resultados (PLR), jornada de trabalho e defesa de
benefícios sociais conquistados ao longo dos anos 80 (Oliveira. 2004).
As entidades sindicais buscaram novos caminhos e
novas respostas diante dos constrangimentos à mobilização e organização
sindical. Começava a se difundir, em meados dos anos 90, uma noção mais
ampliada de sindicato: o “sindicato cidadão”-, voltado para a luta contra o
desemprego, a exclusão social e a cidadania. O alvo do movimento sindical
deixou de ser apenas o trabalhador empregado, mas também o trabalhador
desempregado. Questões como qualificação profissional, educação de jovens e adultos,
geração de emprego e renda, intermediação de mão de obras, cooperativismo,
empresas autogestionárias, e uma série de outros temas, começaram a fazer parte
do vocabulário e das ações sindicais. Sem abrir mão das tarefas clássicas de um
sindicalismo combativo, um novo ciclo se abria para o sindicalismo cutista que
procurava responder através da sua intervenção no campo das políticas públicas a
crescente exclusão social com todas as suas mazelas que minavam a força
mobilizadora dos sindicatos.
A
partir da vitória de Luiz Inácio Lula da Silva em 2002, a CUT irá experimentar
um cenário político com o qual havia sonhado por muito tempo. O candidato
vitorioso e o seu partido (PT), cuja identidade com a CUT sempre esteve
associada a sua figura, conquistou a vitória através de um amplo arco de
alianças que incluíam de partidos de esquerda de extração marxista a
tradicionais políticos conservadores. Para enfrentar a grave crise econômica
herdada do governo anterior e para tranqüilizar a elite econômica, o governo de
Lula teve que assumir compromissos na área econômica que desapontaram não só a
CUT, mas os outros movimentos sociais que almejavam por mudanças mais rápidas.
Mesmo
a Reforma Sindical, tida como objetivo estratégico para a CUT durante o governo
Lula, que criou o Fórum Nacional do Trabalho (FNT), espaço tripartite reunindo
representantes do governo, dos empresários e dos trabalhadores. A participação
da CUT no FNT sempre foi marcada pela defesa por “mudanças radicais e urgentes
no modelo de organização sindical”[20].
Apesar das ambigüidades inerentes a qualquer
organização popular, democrática e de massa como a CUT, não resta dúvida que a
trajetória da nossa Central se constituiu e, ainda se apresenta, como uma das
experiências mais significativas do sindicalismo de esquerda no Brasil. A CUT
desempenha um papel fundamental na defesa dos interesses dos trabalhadores,
tanto do ponto de vista econômico como do ponto de vista social e político.

A
CUT tem compromisso com um novo projeto de sociedade e de Desenvolvimento, o
desafio no final da primeira década do século XXI é pautar na sociedade
brasileira uma agenda que vá além dos debates sobre indicadores macroeconômicos.
Uma agenda que tem como objetivo a busca da permanente ampliação de direitos,
como o Estado assumindo o papel de indutor desse novo modelo de
desenvolvimento, com regulação pública do trabalho e com democracia
participativa.
Conforme
se afirma na plataforma da classe trabalhadora, um documento base destinado à
atuação da CUT nas eleições 2010, “Para a CUT, desenvolvimento compreende o
processo histórico de evolução técnica e tecnológica, bem como de produção e
reprodução das condições de vida no planeta. Portanto, entendemos como essencial
e imperioso um profundo debate sobre as bases para um novo paradigma de
desenvolvimento que, como expressa a Resolução do 10º CONCUT, seja
ambientalmente sustentável, socialmente equitativo e geopoliticamente
equilibrado”. [21]
[1] Depoimento de Gilson Luís de
Menezes, então diretor de base do Sindicato dos Metalúrgicos de São Bernardo do
Campo, sobre a greve na Fábrica Saab Scania do Brasil S/A, ocorrida em 12 de
maio de 1978, onde era diretor de base apud Bargas e Rainho
(1983:68).
[2] “A Greve do Gato Selvagem” –
Raymundo Périllat. In Revés do Avesso 04 e 05, ano 15 abril/maio 2006.
p. 23, 24, 25.
[3] Dentre os 21 itens da pauta de
negociação dos metalúrgicos, os dois principais eram o reajuste de 34,1% e a
estabilidade para os delegados sindicais, na proporção de um delegado para cada
grupo de 500 empregados, assegurando-se o número mínimo de um empregado para as
empresas com menos de 500 trabalhadores e a estabilidade garantida, ainda que o
empregado não tivesse ultrapassado o período de experiência. (Bargas e Rainho,
1983:214).
[4] Acusação respondida por Lula em
assembléia com mais de 70 mil pessoas; “O nosso movimento é um movimento de 110
mil trabalhadores sem nenhuma interferência de qualquer grupo estranho à
categoria... a greve dos trabalhadores ainda é uma greve que está reivindicando
melhores salários, melhores condições de vida”. In Folha de São Paulo
1803/79 Apud. Antunes (1988:46)
[5] A trégua proposta era de 45 dias,
período em que se tentaria obter um reajuste mais satisfatório do que aquele alcançado
pelos metalúrgicos do interior; caso contrário, os metalúrgicos do ABC
deflagrariam novamente a greve geral. Lula argumentava: “A coisa se inverteu de
tal forma que existem três coisas fundamentais... a primeira delas é a garantia
da volta à normalidade do nosso sindicato... existe outra coisa, que é a
reabertura das negociações, porque temos 11% em jogo e não vamos abrir mão
deles; e há outra coisa a ser feita, que é o pagamento dos dias em que estamos
em greve”. (Antunes. 1988:50).
[6] “As relações dos
sindicalistas “autênticos” com as “oposições sindicais” sempre foram marcadas
por identidades importantes, mas também por significativas diferenças. Por
atuar no mesmo setor, pela proximidade e por sua importância estratégica, a
relação foi mais intensa com a OSM-SP. Com esta, uma questão em particular, foi
objeto de ressalvas e de certas divergências: seus respectivos entendimentos
quanto ao papel das comissões de fábricas (cujas inspirações principais eram as
experiências da Cobrasma, em Osasco, até as greves de 1968 e das Comissões
Obreiras da Espanha) e dos grupos inter-fábricas e suas relações com os
sindicatos. O espaço sindical estava tendo significados muito diferentes na
experiência do ABC, em comparação com a de São Paulo. Sem o apoio do sindicato,
as lutas operárias em São Paulo emergiram constituindo, autonomamente, diversas
experiências de comissões de fábrica e grupos inter-fábricas.
Tal processo contou com um papel decisivo da OSM, que, por sua vez, tornou-se a
principal referência dessas lutas e uma referência importante no debate
sindical que ocorria, com um novo impulso, em todo o país. (Véras de Oliveira.2002:p58).
[7] Entre janeiro e março de 1980
foram realizadas 215 reuniões (por fábrica) no sindicato e 65 assembléias nas
entradas e saídas dos turnos, nas portas de fábrica. Foram impressos 450 mil
boletins; 600 mil suplementos da Tribuna Metalúrgica; 62 mil adesivos;
19 mil cartazes e 20 faixas convocando para assembléia decisiva de 30 de março
de 1980. (Antunes, 1988: 66)
[8] Iniciadas tardiamente, as
negociações acirraram-se nos pontos nodais: a FIESP ofereceu 3,65% e depois
chegou a oferecer 5% de reajuste acima do INPC, em resposta à reivindicação de
15% dos trabalhadores. Quanto
ao piso salarial, os patrões ofereceram Cr$ 5.904,00 frente a uma reivindicação
de Cr$ de 12.000,00. A estabilidade de 12 meses, a redução da jornada de
trabalho para 40 horas semanais, o reconhecimento do delegado sindical e o
controle da chefia, foram recusados pela entidade patronal. (Antunes, 1988: 67-69).
[9] Sobre as articulações sindicais
que antecederam a criação da CUT, ver: Gianotti e Neto (1990); Rodrigues
(1997); Rodrigues (1991); Oliveira (2002 a).
[10] Segundo Rodrigues (1991:17), essa
junção de sindicalistas com militantes dos movimentos sociais se explica
diretamente pela atuação de intelectuais militantes ligados à Igreja. “Entre
estes, cumpre citar Frei Beto, que teve papel relevante na aproximação dos
“autênticos” com os movimentos sociais e no encaminhamento dos militantes católicos para
o PT” Sobre a atuação da Igreja no movimento popular, ver: Mainwaring (1989) e
Martins (1994).
[11] Somente nas bases dos metalúrgicos
de São Bernardo foram mais de 13 mil demissões na Volks; 6 mil na Mercedes; 2
mil na Ford e mais de 20 mil no restante das empresas. Véras de Oliveira
(2002:138). As taxas de desemprego aberto flutuaram de em torno de 8%, em 1981,
até 9,2%, em janeiro de 1982 Noronha ( (1991:106).
[12] Voz da Unidade, 11/8/83,
apud. Gianotti e Neto (1990:45). Segundo os autores, o cerne desta polêmica
estava na discussão sobre a liberdade e a autonomia sindicais, incluindo a
aprovação ou não da Convenção 87 da OIT e suas conseqüências: eliminação do
imposto sindical, fim da unicidade sindical, e fim de qualquer ingerência do
governo nos sindicatos.
[13] Em setembro de 1982, o quadro era
o seguinte: 1) CONCLAT adiado; 2)mudanças no critério e na composição da Comissão Nacional
Pró-CUT; 3) duas convocações para duas reuniões diferentes: uma para 27 e 28 de
novembro e outra para 4 e 5 de dezembro. Nos meses de setembro outubro e
novembro realizaram-se os ENCLATs. Na mencionada reunião de novembro foi
deliberado que: o CONCLAT seria realizado nos dias 26, 27 e 28 de agosto de
1983, em São Paulo também se aprovou o regimento interno, o temário, o plano de
lutas e a eleição da “Nova Comissão Nacional Pró-CUT” com 69 membros, mais a
confederações e entidades nacionais. Até maio/junho, tudo fazia crer que o
CONCLAT seria realizado sem maiores questionamentos. I Congresso da Classe Trabalhadora.
1984. Publicação da CUT/Tempo e Presença Editora. p. 49-50.
[14] Op.cit. p.78. Nas páginas
seguintes há uma detalhada descrição do processo organizativo do congresso.
[15] O total de entidades estava
distribuído da seguinte forma: 355
sindicatos urbanos; 310 sindicatos rurais; 99 associações de funcionários
públicos; 134 associações pré-sindicais; 5 federações; 8 entidades nacionais e
1 confederação. A participação foi maior
que na I Conferência de 1981 (5036 delegados). A participação do campo quase
duplicou em número de delegados, apesar da ausência da CONTAG e das 23
federações do campo (1658, contra 916 em 1981). Os trabalhadores do setor
público se juntaram aos trabalhadores do setor privado com uma participação
três vezes maior: 483, contra 145 em 1981. A grande ausência foi das
confederações e das federações: 68, contra 206 em 1981. Op.cit., p. 33 e
74.
[16] O bloco contrário, que não
participou da fundação da CUT, convocou o “seu” Congresso Nacional da Classe
Trabalhadora, também com o nome de CONCLAT, para novembro do mesmo ano. O
congresso elegeu uma Coordenação Nacional mantendo a mesma sigla. Cerca de três
anos depois, em março de 1986, a CONCLAT realizou outro congresso que resultou
na formação da Central Geral dos Trabalhadores (CGT). Ver Rodrigues
(1991:35).
[17] Para o sindicalismo rural as
ressalvas devem ser maiores: em 1986, até maio, segundo a Pastoral da Terra,
mais de 110 trabalhadores rurais haviam sido assassinados em conflitos
agrários. Véras de Oliveira (2002:153).
[18] “Entre todos os três tipos de
empresas estudados (pública, de capital privado nacional e multinacional), a
influência da CUT ultrapassava em muito a da CGT, uma vez que a grande maioria
dos sindicatos de categoria era favorável à CUT. Assim, podemos concluir que a
CUT tem conseguido, ao longo dos anos, atrair o apoio não só de um número maior
de sindicatos, mas também especialmente os que representam trabalhadores das
maiores companhias presentes na economia”. Sandoval (1994:162-63).
[19] As disputas no interior do
movimento sindical ganharam um novo ingrediente nos anos 90 com a fundação, em
março de 1991, de uma nova central sindical-, a Força Sindical, que tornou-se
porta voz de um projeto, que desde o início, incorporava o ideário liberal e
revelava o desejo de suas lideranças de fazer dela uma alternativa à CUT, que
representaria o “sindicalismo estéril” e um “partidarismo inconseqüente”, e às
CGTS, tidas como expressão de “conformismo” e de uma “proposta
conservadora”.Cardoso e Rodrigues(1993:17-21) apud Oliveira (2004:273).
[20] Porém a
direção aponta que a sinais de acomodamento à estrutura oficial: “Nesse
sentido, é preciso que a CUT enfrente, de forma crítica, o acomodamento de suas
estruturas e entidades aos marcos da estrutura sindical corporativa, propondo
estratégias e ações concretas para que suas entidades rompam firmemente com as
amarras do atual modelo”. Caderno de Teses do 9º Congresso Nacional da CUT,
2006. p.32.
[21] Jornada pelo
Desenvolvimento: Plataforma da CUT para as Eleições 2010, março de 2010.
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